A CONSTRUÇÃO DE SABERES PEDAGÓGICOS: DO COTIDIANO AO
COTIDIANO ESCOLAR
THE CONSTRUCTION OF PEDAGOGICAL KNOWLEDGE:
FROM DAILY TO SCHOOL DAILY
José
Ribamar Tôrres Rodrigues
Doutor
em Educação pela USP
Mestre
em Educação pela PUC/SP
Estágio
em Formação de Professores no IUFM de DOUAI/ França
Estágio
em formação de Professores em CUBA
Ex-Membro
do Conselho Estadual de Educação/PI
Ex-Coordenador
do Fórum Estadual de Educação
Membro
do Banco de Avaliadores do MEC/INEP
TEL: (86) 99415-9958
José Ribamar Rodrigues Tôrres
PhD in Education from USP
Master in Education from PUC / SP
Internship in Teacher Training in the
IUFM of DOUAI / France
Stage for Teacher training in Cuba
Former member of the State Board of
Education / PI
Ex´-Coordinator of the State Education
Forum
Member of Appraisers Bank MEC / INEP
TEL/whatsApp: (86) 99415-9958
RESUMO
Este texto objetiva discutir
categorias teóricas como habitus (Bourdieu),
saberes (Tardif ; Gauthier), cotidiano (Heller), dentre outros, aplicáveis à
análise e compreensão de práticas pedagógicas de docentes, especialmente professores
rurais, tendo a sala de aula como espaço social onde ocorrem processos de
construção e reconstrução de saberes e saberes pedagógicos.
ABSTRACT
This text aims to discuss theoretical categories such as habitus (Bourdieu), knowledge
(Tardif; Gauthier), daily life (Heller), among others, applicable to the analysis and understanding
of teaching practices of teachers, especially rural teachers, with the classroom as a space. where
processes of construction and reconstruction of pedagogical knowledge and knowledge occur.
RESUMÈ
Ce texte vise à discuter des catégories théoriques telles que l'habitus (Bourdieu), la connaissance
(Tardif; Gauthier), la vie quotidienne (Heller), entre autres, applicables à l'analyse et à la
compréhension des pratiques pédagogiques des enseignants, en particulier des enseignants
ruraux, avec la classe comme espace. où se produisent les processus de construction et de
reconstruction des connaissances pédagogiques et des connaissances.
RESUMEN
Este texto tiene como objetivo discutir categorías teóricas como habitus (Bourdieu), conocimiento
(Tardif; Gauthier), vida cotidiana (Heller), entre otras, aplicables al análisis y la comprensión de las
prácticas docentes de los docentes, especialmente los docentes rurales, con el aula como espacio.
donde ocurren procesos de construcción y reconstrucción del conocimiento pedagógico y el
conocimiento.
SOMMARIO
Questo testo mira a discutere categorie teoriche come habitus (Bourdieu), conoscenza
(Tardif; Gauthier), vita quotidiana (Heller), tra gli altri, applicabili all'analisi e alla comprensione
delle pratiche di insegnamento degli insegnanti, in particolare degli insegnanti rurali, con l'aula
come spazio. dove avvengono processi di costruzione e ricostruzione di conoscenze e conoscenze
pedagogiche.
ZUSAMMENFASSUNG
Dieser Text zielt darauf ab, theoretische Kategorien wie Habitus (Bourdieu), Wissen
(Tardif; Gauthier), Alltagsleben (Heller) ua zu diskutieren, die für die Analyse und das
Verständnis der Unterrichtspraktiken von Lehrern, insbesondere von ländlichen Laienlehrern,
mit dem Klassenzimmer als Raum anwendbar sind. wo Prozesse der Konstruktion und
Rekonstruktion von pädagogischem Wissen und Wissen stattfinden.
РЕЗЮМЕ
Этот текст направлен на обсуждение теоретических категорий, таких как габитус (Бурдье),
знания (Тардиф; Готье), повседневная жизнь (Хеллер), среди прочего, применимых к анализу
и пониманию педагогической практики учителей, особенно сельских учителей-мирян, с
классной комнатой в качестве пространства. где происходят процессы конструирования и
реконструкции педагогических знаний и знаний.
REZYUME
Etot tekst napravlen na obsuzhdeniye teoreticheskikh kategoriy, takikh kak gabitus (Burd'ye),
znaniya (Tardif; Got'ye), povsednevnaya zhizn' (Kheller), sredi prochego, primenimykh k analizu i
ponimaniyu pedagogicheskoy praktiki uchiteley, osobenno sel'skikh uchiteley-miryan, s klassnoy
komnatoy v kachestve prostranstva. gde proiskhodyat protsessy konstruirovaniya i rekonstruktsii
pedagogicheskikh znaniy i znaniy.
A
sala de aula, como espaço social, representa um campo plural e permanente de
construção de saberes a partir de interações e representações que constituem as
estruturas de produção de saberes. As
interações incorporam significados gerados pelas representações e, estas, por
sua vez, são reelaboradas pelas novas interações, criando novos significados,
mediatizados pelo discurso de sujeitos situados em um determinado horizonte
social, no caso, o espaço geográfico, da sala de aula da escola da sociedade.
Mais
recentemente, vários estudos utilizam as abordagens do cotidiano, baseados
principalmente nas teorias de Lefebvre, Lukács, Kosik (1967) e Agnes Heller
(1977), e nas pesquisas de Patto (1991), Rockwell y Ezpeleta (1983) bem como
nas contribuições da hermenêutica e da epistemologia genética.
O
cotidiano da sala de aula do professor apresenta singularidades em relação
àquilo que se passa em outros espaços educacionais. Tais singularidades correspondem
a uma rede de relações do cotidiano que representam uma tradução reelaborada
das mesmas em razão de uma determinada visão de classe e da história dos
sujeitos que ali interagem.
As
sociologias clássicas totalizantes como o positivismo, o marxismo e o
funcionalismo no intuito de racionalizar a sistematização de macromodelos e
macrossistemas sobre os aspectos sociais, ignoravam a dimensão dos eventos do
cotidiano no plano sócio-econômico global, tal qual se refere Laura Bovone,
(1996). É no espaço cotidiano que os agentes sociais estabelecem suas relações
e constróem seus significados, que por sua vez justificam suas ações. Este
processo de relações e significados representam as condições iniciais de
elaboração e reelaboração de saberes sobre si mesmos, sobre sua prática e sobre
a realidade onde vivem. Daí, tornar-se necessário conhecer os mecanismos pelos
quais os sujeitos são motivados a se movimentar entre valores e realidade ou
entre subjetivismo e objetivismo.
Diversos
trabalhos enfatizam a idéia de mecanismos de mediação na atividade do sujeito
frente à realidade, vinculadas a diferentes correntes teóricas. O cotidiano escolar, de certa forma, sofre
limitação das normas institucionais e sociais, mas alguns eventos que ocorrem
ali demonstram uma independência relativa em relação a essas conformações,
tendo em vista que tais eventos, gestados por subgrupos, assumem um sentido
particular. Suas ações não parecem assim, tão óbvias para os demais elementos
do campo. Para Bourdieu a noção de habitus
como “estruturas estruturadas / estruturantes” permite a compreensão da geração
de práticas e representações dos sujeitos na sua relação com a estrutura
social.
Estudar
as práticas pedagógicas do cotidiano escolar e da sala de aula de professor é
procurar compreender dimensões e sentidos muito particulares das ações que
ocorrem no contexto genérico social e educacional e como elas se articulam com
a realidade mais ampla. Com relação a isso, Bueno diz que.
“...
é necessário se ultrapassar o registro oficial para se chegar a uma história
que, não documentada, repousa noutro lugar: nas práticas e nas concepções dos
agentes. Nesta história acumulada na memória e no corpo dos que vivem, confluem
sociedade e Estado, não de modo abstrato, mas com a concretude de indivíduos
que se apropriam das prescrições características das instituições
burocratizadas para materializar a instituição escolar no dia a
dia".(p.43).
Desse
modo, as características geográficas, a história dos sujeitos e a posição que
ocupam na hierarquia social do lugar onde se situa a escola, produzem reflexos
nas condições sócio econômicas, modos de ser, nas percepções sobre escola,
trabalho e vida de professor e alunos. O cotidiano tem como principal
característica à espontaneidade embora “nem toda a atividade cotidiana seja
espontânea”, (Heller, 1987, p.300). Isso quer dizer que ele não é de todo
imprevisível. Nas suas relações, embora os sujeitos partam de certas regras e
posições sociais e institucionais, de tempo e espaço, previamente determinados,
contrapõem-se a elas através de saberes, habilidades e valores, inseridos nas
suas representações para a construção de novas relações que vão atender a
expectativas pessoais, institucionais e sociais que antes de imprevisíveis são contraditórias,
mas como mecanismo de defesa só deixam revelarem-se os resultados que assegurem
o funcionamento coletivo que os legitima como grupo e como instituição.
Nesse
sentido, Chizzotti (1992) defende que.
É
preciso (...) investigar os rituais rotineiros que estão cristalizados na vida
diária, esse movimento mecânico das ações que acabam constituindo o dia-a-dia,
porque é neles que vamos encontrar a racionalidade subjacente da vida cotidiana
das pessoas. Aquilo que se considera banal, inútil, desnecessário, rotineiro,
absurdo (...) são esses atos triviais e banais que servem de base para fazer
uma descrição elaborada do que as pessoas precisam, falam e compreendem (...)
outro viés é considerar o cotidiano como campo residual da vida. (...) Se o
cotidiano fica proscrito da vida ou considerado como rescaldo dela, fica também
desterrado de todos os atos deliberados da vida e de toda a impossibilidade de
impregnarmos de uma vontade consciente esses atos. E os sujeitos que são vistos
nesse cotidiano estão no meio pobre, onde, como atores sociais, se tornam
invisíveis e suas práticas inconseqüentes “(p. 89-95)”.
O
cotidiano das práticas pedagógicas de professor e alunos revelam uma
característica multicultural e multidisciplinar, ocupando espaços e tempos de
ensino e aprendizagem diferentes dos espaços e tempos medidos e cronometrados
pelo sistema oficial que em oposição ao cotidiano onde a lógica do tempo da
aprendizagem e da ação docente têm uma dinâmica própria. Neste aspecto, Lefebvre (1961), diz que há
tempo social e tempos sociais distintos dos tempos biológicos, psicológicos,
físicos e um espaço social diferente do espaço geométrico, físico e biológico e
do espaço cotidiano que apresenta quatro dimensões distintas daquelas definidas
por matemáticos e físicos: o tempo realizado, o previsto, o incerto e o
imprevisível.
As
práticas pedagógicas de professor em sala de aula se definem a partir de um
espaço e tempo de vida cotidianos onde os sujeitos percebem o caráter cíclico
de suas práticas, mas não percebem os diferentes tempos e espaços, geradores da
história que presidem e dão diferentes sentidos a essas rotinas.
Na
obra de Bourdieu, analisada por Renato Ortiz (1893, p. 8), são evidenciadas
três premissas epistemológicas, quais sejam, o conhecimento praxeológico, o
conceito de campo e a noção de habitus.
Interessa, neste texto, a abordagem que faz Bourdieu sobre a noção de habitus como mediação entre o agente
social e a sociedade.
Para
Ortiz, (1983), Bourdieu enfatiza a importância de se estudar o modo de
estruturação do habitus, através das
instituições de socialização dos agentes que se entende, sejam os grupos
sociais: família, religião, trabalho, escola, etc.
Para
estudar um conjunto de saberes, habilidade e valores da estrutura da prática
pedagógica do professor no trabalho de sala de aula, o conceito de habitus, enquanto conceito geral, parece
não ser o suficiente bastante para desvendar as “tramas” das relações
particulares de habitus construídos
na dinâmica das interações e representações do cotidiano escolar,
caracterizados pelo estilo pessoal que Bourdieu chama de “desvio codificado em
relação ao estilo de uma época, uma classe ou um grupo social” ou “variante
estrutural do habitus”. Tentando-se
compreender estes habitus particulares
da prática pedagógica do professor, agrega-se, aqui, a noção de habitus pedagógico que surgiu da
reflexão do conceito de habitus de
Bourdieu. Desse modo, o habitus é particular e genérico por estar em toda atividade humana
e em todo homem e o habitus pedagógico
é, também, particular e genérico por estar em toda atividade educativa,
especialmente na formação de professores e na atividade pedagógica de cada
professor. Nesse sentido, as práticas pedagógicas do professor têm,
simultaneamente, um caráter particular e genérico porque se estruturam a partir
de habitus por eles apropriados na
trajetória familiar, estudantil, profissional, exteriorizados na sala de aula,
que se constitui num espaço privilegiado, onde fragmentos de cotidiano e de história
oficial tecem-se para a construção de uma história particular.
Assim,
considerando-se a sala de aula com um locus
de relações de força, os habitus
pedagógicos
são heterogêneos, em escala e sentido, assumindo funções e significados
heterogêneos neste espaço de luta ( escola versus cotidiano) para fazer
prevalecer um modo de fazer. O habitus,
no sentido empregado por Bourdieu, parece não poder ser, simplesmente,
transplantado para a situação das práticas do cotidiano escolar como se fosse
possível aplicá-lo a todos os eventos que ali ocorrem e como se todos se dessem
a nível genérico, sem que particularidades específicas estivessem na natureza
destas práticas docentes.
A
teoria do conhecimento praxeológico de Bourdieu parece não estar preocupada
como mudar as estruturas sociais, mas como os sujeitos se adequam a elas.
Parece acreditar que as ações dos indivíduos são produtos de fatores sociais
que influem sobre e através deles, ignorando os fatores psicológicos contidos
nas ações sociais elaboradas por processo de interpretações dos sujeitos, como
defendem os interacionistas. Em
conseqüência, as premissas sobre transformação social aparecem, apenas
implícitas ou fugazes (Renato Ortiz, 1994). Embora não desenvolva uma teoria da
transformação social, o conceito de habitus
não se reduz à apropriação de estruturas anteriores para serem aplicadas no
cotidiano do indivíduo; não se refere a um sentido “repetitivo, mecânico e
automático” como explica o próprio autor (1983, p. 105), onde expõe que os habitus tendem a uma lógica de
reprodução e transformação objetivas. Assim, Bourdieu imprime ao conceito de habitus um processo dialético onde, a
“interiorização da objetividade e exteriorização da interioridade”, embora se
dêem de forma subjetiva, não pertencem somente à esfera individual, uma vez que
os habitus de referência do grupo ou
da classe são garantidos à proporção que estes indivíduos “internalizem
representações objetivas” de acordo com as “posições sociais que ocupam”.
Com
isso, pode-se compreender uma grande contradição nas relações profissionais e
sociais da prática pedagógica de professores, especialmente de professor.
Enquanto profissionais, eles “internalizam representações “objetivas”(habitus pedagógicos) através do
currículo escolar e do processo de formação que expressam uma outra visão de
classe. Enquanto indivíduos, pertencentes a um outro grupo social, eles
reinterpretam, através da prática pedagógica, essas “representações objetivas”
dos currículos escolares e da formação, por meio de habitus (que Bourdieu explica como “estruturas estruturadas
dispostas a funcionarem como estruturas estruturantes”) incorporados nas
relações de âmbito particular de classe, isto é, que podem gerar e ‘regular’
novas práticas independente de regras orientadas para um fim”.
Isso
implica que, o professor, no processo de formação e como profissional,
internaliza o genérico do quotidiano social para exteriorizá-lo pelo particular
do cotidiano de classe. Talvez, se possa concluir disso que o habitus das relações particulares de
classe, também contido no habitus
genérico do social mais amplo, cunhe no professor uma identidade tendente a
determinar a constituição de habitus
pedagógicos ulteriores.
Nesse
sentido, tenta-se articular, apoiando-se nos conceitos de habitus e de cotidiano,
uma análise descritiva de saberes, práticas e representações construídas e
apropriadas pelo professor na prática pedagógica de sala de aula.
Para
Raymond (apud Tardif e Gauthier,
1996), em pesquisas recentes, não está clara a noção de saber, por isso é
necessário distinguir saberes de certezas, crenças e habitus, no sentido utilizado por Bourdieu que assim o entende:
“esquemas de ação e pensamento interiorizados no quadro da socialização
profissional ou até no da história escolar ou mesmo familiar dos
professores”(p. 26). Neste aspecto, embora pertinente à idéia de não clareza da
noção de saber, entende-se parcial o conceito de habitus empregado por Tardif e Gauthier, considerando-se que
Bourdieu não toma este conceito, como já explicitado anteriormente, apenas,
como um elemento mecânico, repetitivo (estrutura estruturada), mas como gerador
de habitus ulteriores (estrutura
estruturante), incorporando a idéia de reprodução e de possível transformação.
Para
Tardif, Lessard e Lahaye (1991), o saber docente é um saber plural, formado
pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação
profissional, dos saberes das disciplinas dos currículos e da experiência.
Com
base em Tardif e Gauthier (1996), a questão do saber, a partir de perspectiva
histórica, refere-se a pesquisas do início do século, centradas nos traços de
personalidade do professor; com relação aos problemas epistemológicos, as
pesquisas consideram a sala de aula como singularidade e generalização, visando
estabelecer uma regra de funcionamento; os problemas políticos caracterizam-se
pela implantação de ações governamentais com base em ideologias geradas por
pesquisas, relacionando qualidade da educação à competência dos professores; e
problemas metodológicos expressos na limitação das sínteses de pesquisas gerados
pela 'mega-análise' - síntese das sínteses - que induzem os resultados a
procedimentos matemáticos, voltados para resultados obtidos.
Nos
anos de 1980 e 1990, o movimento de profissionalização determinou a crença de
que a atividade docente não poderia se profissionalizar nem alcançar melhor desempenho
do aluno se não se fundamentasse em saberes especializados e para isso seria
necessário se apoiar em pesquisas para determinar a base de conhecimento do
professor.
As
questões, no entanto, remontam aos anos pós Segunda Guerra, quando pesquisas
tentam medir a eficácia do ensino não mais por traços de personalidade, mas
pelo rendimento de diferentes métodos utilizados em sala de aula. Os efeitos dos métodos eram confundidos com a
diferença de utilização dos mesmos pelo docente, uma vez que a base era o
estudante e não o docente na comparação entre salas de aula.
Nas
décadas de 1950 e 1960 foram realizados estudos a partir de observações mais
centradas nas atividades pedagógicas, mas não eram relacionadas com o sucesso
escolar. Nos anos setenta, evidenciaram-se as abordagens processo-produto,
etnometodológicas e cognitivas voltadas para o desempenho dos alunos,
procurando saber se isto era determinado pelo docente, pela classe social ou
por programas escolares.
Para
estes autores, o problema epistemológico consiste em considerar, ao mesmo
tempo, a sala de aula como uma atividade singular que não pode conduzir a uma
generalização e, também, como uma estrutura estável que possa ser estudada e, a
partir daí, elaboradas leis ou regras de funcionamento do trabalho docente.
Isso recomenda prudência na utilização de resultados de pesquisas, que devem,
apenas, fornecer informações ao docente. Em seus estudos, Tardif e Gauthier
levantam problemas políticos da pesquisa científica, em relação aos Estados
Unidos, dizendo que os mesmos foram evidenciados a partir do relatório do
chamado Grupo Holmes onde se afirmava
que para reformar a educação era necessário tornar os professores mais
competentes. Com base nessa conclusão,
grupos políticos e econômicos dominantes teriam conseguido transferir a crise
da educação para a escola e, principalmente, para os professores.
Com
relação ao aspecto metodológico, Tardif e Gauthier (1996) afirmam que os
trabalhos que visam sintetizar os resultados das várias pesquisas são limitados
por problemas metodológicos gerados pela “mega-análise. Para eles, isto não
pode reduzir-se a procedimentos matemáticos, pois deve incluir principalmente
discussões sobre os resultados obtidos. Os problemas são gerados a partir dos
objetivos de resultados de pesquisas de ordem prática, ou seja, visam
incorporar tais resultados a programas de formação docente. Isto, porém, nem
sempre ocorre, uma vez que este é muito mais um processo deliberativo e
político. Tais pesquisas caracterizam-se pelo aspecto sócio–histórico na medida
em que procuram situar os saberes como produtos sociais e permitem apreender
suas transformações; e, pelo aspecto sócio–epistemológico, na medida em que não
se limitam as análises de saberes, a dimensões internas (formais, lógicas,
cognitivas), mas também as insere num sistema de práticas simbólicas,
vinculadas ao sistema de ações sociais.
Metodologicamente,
esses estudos orientam-se pelos princípios da pluralidade e evolução do saber,
vinculando-se a outros aspectos escolares, compreendidos a partir do contexto
em que se dão, do exercício da profissão e determinado pela natureza do
trabalho docente.
Maurice
Tardif, Claude Lessard e Louise Lahaye (1991), consideram que a prática docente
integra diferentes saberes: os saberes das disciplinas (materiais escolares e
conteúdos), os saberes curriculares (programas das disciplinas), os saberes
profissionais (ciências da educação
e pedagogia), os saberes da
experiência ou saberes práticos (constituídos ou absorvidos na ação
quotidiana), e os saberes culturais (cultura geral de cada docente). No entanto
alertam que diferentes pesquisas apontam diferentes tipologias de saberes.
Estes autores discutem a relação dos docentes com os saberes, lembrando que nas
sociedades pré-modernas as tarefas de produção e transmissão do saber se
integravam em um só sujeito. No entanto, com o desenvolvimento do capitalismo
há uma separação cada vez maior entre a produção de saberes e a formação nos
saberes. Como conseqüência, dizem eles que.
"Se os cientistas são valorizados em sua atividade de produção de
conhecimento, os docentes são, progressivamente, subvalorizados em sua tarefa
de ensino. Concebem-se os docentes como técnicos e executores aos quais
competem dominar os saberes e as técnicas para sua transmissão" (p.217-18 ).
Entende-se
pertinente esta crítica visto que traz à tona a idéia de saber plural no qual o
professor não pode ser reduzido à tarefa de execução. Na sua prática, ele
adita, aos saberes que lhes são impostos, a sua experiência, construindo,
portanto, um novo saber embora na maioria das vezes não se dê conta disso.
O
surgimento das ciências educativas, segundo esses mesmos autores, levam para
esta atividade, a fundamentação da pedagogia moderna, especialmente dos saberes
psicológicos e psicopedagógicos, os quais produzem um saber cada vez mais
especializado e técnico; por outro lado, o centro do ensino se desloca do
professor para o aluno como resultado do surgimento das diferentes tendências
pedagógicas, como a Escola Nova, já que não se trata de aprender conteúdos, mas
de aprender a aprender.
Caldeira
tipifica alguns saberes docentes: a coeducação que se refere a estratégias para
superar estereótipos na questão sexual (menina/menino); organização do tempo,
através dos planos e projetos de trabalho, superando processos tradicionais
vigentes; organização do material em pastas
em uma seqüência de atividades; organização da interação que se refere a um
conjunto de regras geradas ou negociadas;
o processo de tomada de decisão, através de explicação aos alunos e
envolvendo-os no mesmo; o trabalho coletivo na sala de aula quando o docente
tenta ser democrático sem ser parcial, promovendo a participação de todos; a
conduta reflexiva do aluno ante o processo de aprendizagem que procura tornar
os estudantes em vez de executores, reflexivos, considerando que aprender é
incorporar, relacionar, argumentar.
O
objetivo central do trabalho docente, segundo esta autora, é aprender a aprender para que os alunos
tenham consciência do seu próprio processo de aprendizagem e aprendam a
utilizar diferentes estratégias; a promoção da igualdade entre meninos e
meninas, em termos de linguagem e gênero, como elementos da diversidade e
superação de estereótipos sociais; interação com o aluno com base em
informações obtidas na família, procurando intervir segundo as características
de cada um; articulação dos conteúdos escolares, procurando transformar a informação
em conhecimentos, trabalhando fatos, conceitos, procedimentos e atitudes.
Na
prática de sala de aula, o processo interativo professor-aluno, aspectos
tácitos internos e externos entram em concorrência com o que determina a norma
institucional. As relações se orientam menos pela origem sócio econômica que
pelos aspectos subjetivos de laços familiares e pelos aspectos objetivos de
interesses sócio-políticos. A própria representação que o professor tem dele e
de sua atividade profissional determina os termos da relação com os alunos e
com a comunidade onde trabalha. O professor percebe os critérios tácitos que a
comunidade adota para a “consagração” de um dos seus membros, especialmente do
professor, e por isso adota estratégias de persuasão nem sempre coerentes com a
norma institucional.
É
comum os alunos tratarem o professor tomando a bênção e chamando-o de tio/tia,
madrinha/padrinho. O professor, em contra-partida, incorpora estas
representações familiares como parte do papel que ele deve desempenhar, através
de várias formas, dentre outras, não sendo rígido com o aluno; sendo tolerante
quando ele não faz o exercício; quando esquece o material escolar; quando
excede nas condutas ou conversas durante as aulas; quando copia para os alunos
a tarefa no caderno deles; quando o ajuda a responder exercícios e até mesmo
responder por ele; quando compra, com seu pequeno salário, material escolar,
remédio e até roupas para o aluno. Pesquisa sobre os professores revelou que
ele dá muita importância à necessidade de conquistar a amizades dos alunos como
fundamental, não prioritariamente para favorecer o processo de ensino e
aprendizagem, mas, de modo tácito, para atrair a admiração dos familiares e
garantir sua posição de respeito na comunidade e até mesmo o seu emprego.
O
seu prestígio, na comunidade, depende mais das virtudes pessoais, subjetivas,
que possam ser reconhecidas, que das virtudes intelectuais que possa
demonstrar. A atuação do professor como pessoa e suas posições
político-partidárias definem o espaço social, político e profissional que lhe
será reservado “como recompensa”, pela comunidade. Se os mestres-escola eram controlados pelo poder eclesiástico no
século XVI, (Nóvoa, 1986), nos dias de hoje, no Brasil, e com mais ênfase em
regiões menos desenvolvidas dentre as quais se insere o Piauí, os mestres-escola, cuja nomenclatura
modernizada veio tornar-se conhecida como professor,
passam ao controle do poder político local, revelados nos processos de
recrutamento de professores para as escolas rurais, embora tal mecanismo
atravesse um momento de transição através da implantação do concurso público.
Por
outro lado, se o professor é parte de grupos dominantes do lugar, este espaço
lhe é concedido independente das práticas de relações que estabeleça, quer no
espaço profissional quer no espaço social. Os alunos, em geral, são filhos,
sobrinhos ou com alguma relação de parentesco com o professor, ou filhos de
amigos, compadres e conhecidos da comunidade. A interação do professor com os
alunos tem estreita relação com a história das relações do professor com os
grupos familiares ou políticos a que estes alunos estão vinculados.
Assim,
a história das relações de interação e das práticas docentes apoiam-se em
diversos saberes construídos em variadas circunstâncias culturais. Nesse
sentido, Maria Luisa Simoni (1991), estudando a prática docente, analisa como a
construção e a circulação de saberes docentes ocorrem no contexto escolar em
meio às condições de trabalho coletivo de professores e alunos, de recursos materiais
e estratégicos, utilizados pelo professor, de intercâmbio de materiais entre
eles, de relação com as famílias, da carga de trabalho do professor, centrada
mais em atividades extra classe que de sala de aula e das formas de organização
de tempo e espaço em classe.
A
autora discute as condições específicas do trabalho docente de 1o
grau e as diversas propostas pedagógicas existentes na escola onde o professor
constrói individual e coletivamente recursos de aprendizagem utilizados no seu
trabalho em classe. Seu
estudo mostra que tanto as práticas geradas em outros momentos históricos da
escola quanto às dificuldades dos professores em reconstruir suas práticas de
trabalho se devem, em parte, às condições materiais nas quais ocorrem. Ela
sustenta que os professores aprendem a usar os recursos próprios da escola,
atuando de acordo com a forma como esta se organiza e, se apropriando de seus
costumes, tradições, enfim, aprendem a dirigir-se na estrutura da vida escolar.
Todo professor para ter este desempenho tem de se apropriar, também, dos usos
de linguagem adequados a cada nível em que trabalham.
Com
base nisso, vale acrescentar que não se pode perder de vista que o professor
também traz para o âmbito da vida e da cultura escolar representações, concepções,
modos de fazer e de ser que se encontram diluídos na ação coletiva fora da
escola.
Os
estudos até aqui apresentados têm como ponto de partida a apropriação e a
construção do saber docente, evidenciando o cotidiano escolar como processo
social e os saberes docentes como produto deste processo. Enquanto Tardif,
Gauthier, Lessard e Lahaye (1991) preocupam-se com saberes de diferentes
natureza: normativos, pragmáticos, tradicionais e tácitos, tipificando-os em
curriculares, disciplinares, profissionais, culturais e da experiência, para
determinar uma base de conhecimento docente, Caldeira, embora utilizando este
referencial, estabelece subtipos destes saberes na prática pedagógica.
Ambos
se diferenciam de Simoni, que embora admitindo que a construção e circulação de
saberes docentes se dão pelo trabalho coletivo, subordina esse processo às
condições materiais nas quais ocorrem, ou seja, à instituição escolar,
subestimando assim, a influência decisiva, nesse processo, da rede de
representações e interações dos elementos envolvidos no trabalho escolar,
provavelmente, capazes, em algumas circunstâncias, de transformar a
instituição, independente de suas condições materiais.
Os
estudos de Brandão(1983), Therrien (1991), De Vargas (1995) e Abras (1998),
dentre outros, evidenciam a escola rural como transplantação do modelo de escola urbana. Observou-se, no entanto, na área pesquisada,
que isto só é válido enquanto percepção de escola rural do ponto de vista
formal. No interior das relações que se
dão na escola rural, surge uma outra escola que se orienta, em grande parte,
por leis consuetudinárias em vez de leis formais do sistema de ensino;
substitui, em parte as relações hierárquicas e profissionais pela divisão de
responsabilidades, por critérios subjetivos, familiares; substitui, em parte,
os conteúdos curriculares e métodos formais pelos conteúdos do cotidiano e
pelos modos de fazer legitimados pela experiência.
O
jogo de relações ocultas do trabalho docente em sala de aula constitui-se num
espaço simbólico de autodefesa que envolve e camufla um conjunto de relações e
significados que se constrói no cotidiano, entre o real e o aparente, entre o
legal e o informal, entre o documentado e o não documentado. Nem mesmo como
organização a escola rural parece reprodução total da escola urbana,
caracterizando-se por uma estrutura híbrida, composta de elementos formais e
informais. Na verdade, a aparência da organização escolar rural semelhante à da
escola urbana impõe-se como necessária para ser aceita e reconhecida legalmente
pela sociedade como parte de um sistema escolar oficial.
Embora
no aspecto formal pareça homogeneizada, através de leis, fichas, regimentos,
que ao mesmo tempo em que tentam engessar o cotidiano escolar criam espaços
para o seu questionamento, as práticas quotidianas são altamente
diversificadas, constituindo-se, cada qual de uma dinâmica própria e
identificando-se consigo mesmas e com as histórias das culturas que as
criaram. A organização burocrática e o
currículo da escola rural, como ocorre na prática, rompem como o modelo
técnico-racional da proposta oficial.
A
mesma relação de afastamento entre a proposta de escola urbana e a realidade
rural observa-se, também, em relação à escola urbana e às periferias das
cidades. Ao contrário do que parecem
mostrar as análises dos vários estudos aqui apresentados, esta defasagem não é
uma característica exclusiva da educação urbano-rural. Há indícios de que,
principalmente, a rápida expansão urbanística, com a formação de grande
concentração populacional nas zonas periféricas das cidades brasileiras, em sua
grande maioria proveniente do meio rural, tornou o problema da distância dos
conteúdos em relação à cultura destas populações, comum tanto ao espaço urbano
quanto ao rural. É importante ressaltar que mesmo antes desta explosão
migratória do campo para a cidade a escola já revelava indícios desta
característica de ignorar a cultura da população quanto aos diversos estratos
sociais do espaço urbano.
Certamente,
o professor só será capaz de transpor saberes construídos para sua atividade
pedagógica se ele for capaz de superar a prática intuitiva (empírica),
articulando-a com uma prática sistematizada e reflexiva. Assim, a valorização
da experiência constitui-se num elemento de superação dos processos de
construção de saberes e, ao mesmo tempo ponto de partida e de chegada de
sistematização e avaliação de sua prática numa perspectiva de mudança.
No
entanto, tal processo de construção e de sistematização de saberes exige
experiência que para Pierre Dominicé (1990) é imprescindível à existência
pessoal, social e profissional e depende da consciência de que o sujeito
elabora o seu saber durante sua vida e que a "noção de experiência
mobiliza uma pedagogia interativa e dialógica". Nesse sentido, os saberes
da experiência definem um espaço profissional e social, constituído por um
ciclo de práticas que representam as idéias pedagógicas de uma época, mas
também atualizadas pelas experiências individuais e coletivas (jurisprudência pedagógica). Desse modo, diz Nóvoa, (1995), o intercâmbio
entre professores é essencial para solidificar conhecimentos oriundos da
prática profissional e que a produção de saberes e valores refletem na
construção de uma nova cultura profissional dos docentes, uma vez que "a
profissionalização do saber na área das ciências da educação tem contribuído
para desvalorizar os saberes experienciais e as práticas dos professores” (p.
27).
Shulman,
(1986), citado por Carlos García, in Nóvoa (1995), refere-se a diferentes tipos
de conhecimento dos professores: "o
proposicional, o de casos e o estratégico". O proposicional consiste no conhecimento
da investigação didática baseada nas relações casuais. Tais conhecimentos
contém princípios que derivam da pesquisa empírica sobre a eficácia docente. As
máximas são os conhecimentos adquiridos na prática e as normas referentes a
"valores, princípios ideológicos, filosóficos, de justiça e eqüidade” (p.57-8). O conhecimento de casos refere-se a fatos concretos específicos de prática, ligados á
experiência pessoal. Tal conhecimento aparece sob forma de protótipo ou
"aplicação de princípios teóricos precedentes ou situações práticas e
parábolas oriundas da comunicação de valores e normas referentes aos mitos
profissionais". O conhecimento estratégico
refere-se ao que o professor constrói diante de situações conflituosas.
Krogh,
Crews, (1989) e Ross, (1987) classificam três tipos de atitudes necessárias ao
ensino reflexivo, já defendido por Dewey nos anos trinta, que são: a mentalidade aberta que consiste na
"ausência de preconceitos, de parcialidade e de qualquer hábito que limite
à mente e a impeça de considerar novos problemas e de assumir novas
idéias"; a integridade e a harmonia do que se defende; e o entusiasmo que se refere à predisposição
para encarar a atividade com curiosidade
Garcia,
(1995), com base em Zeichner & Liston (1987), aponta três tipos de reflexão
ou de análise da realidade imediata, quais sejam, a técnica, aquela que fazemos das situações explícitas; a prática, que consiste no planejamento do
que se vai fazer e na reflexão do que se realizou; e a crítica, a análise ética e política da própria prática.
Nesse
sentido, o mesmo autor identifica quatro formas de reflexão: a instrospecção, aquela voltada para a
reflexão interiorizada de pensamentos e sentimentos desvinculados da ação
quotidiana; o exame, que consiste na
alusão do professor a eventos realizados ou que poderão ser realizados; a indagação leva o professor a analisar a
sua prática e identificar elementos para o aperfeiçoamento; a espontaneidade, que consiste na ação
intelectual de análise do professor durante o seu trabalho pedagógico onde ele
pode redefinir as ações e implementá-las.
Gómez,
(1995), relacionando a educação escolar e a atuação docente, mostra que há
defasagem entre a expansão escolar, nas sociedades industrializadas, e, em
conseqüência, o aspecto técnico da ação docente, a racionalidade técnica, a
racionalidade prática e o modelo técnico e reflexivo de formação docente.
Este
mesmo autor, com base em Yinger (1986), afirma que a partir dos anos cinqüenta a
tecnologia da educação apoiou-se na psicologia do comportamento, responsável
pela imagem do professor como técnico especializado cuja função é aplicar
regras oriundas do conhecimento científico sistematizado. O processo de
formação de professores tem sido realizado com base na concepção "linear e
simplista, apoiado no componente científico-cultural (conteúdos) e no psicopedagógico
(como atuar em sala de aula)". Critica a racionalidade técnica que defende
a "aplicação do conhecimento e do método científico à análise da prática e
à construção de regras que regulem a intervenção do professor". Para ele,
na "tradição positivista, a primazia do contexto da justificação sobre o
contexto da descoberta, forçou a investigação e a intervenção prática a se
ajustarem aos padrões que validam, a
priori, o conhecimento científico ou as suas aplicações tecnológicas”.
Diz,
ainda, Gómez, com base em Yinger e Shön (1983), que o profissional depende da
capacidade de lidar com realidades diversificadas e de resolver problemas
práticos.
Desse modo, a prática pode tornar-se
repetitiva e o "conhecimento na ação", mecânico, originando-se a
reprodução automática de sua aparente competência prática. Para ele, se o
professor reflete na ação e sobre a ação, "converte-se
num investigador na sala de aula. Afastado da racionalidade instrumental, o
professor não depende de técnicas, regras e receitas derivadas de uma teoria
externa, nem das prescrições curriculares impostas do exterior da escola pela
administração” (p.105-6). Desse
modo, levando-se em conta o pensamento prático do professor, isto requer que se
reveja a "natureza do conhecimento acadêmico, dos princípios e métodos de
investigação na ação e sobre a ação, o papel do professor como profissional e
os princípios, conteúdos e métodos de sua formação". Este pensamento prático, para ele, "não pode ser
ensinado, mas pode ser aprendido (p.112). A Partir da prática pode o professor
construir um pensamento prático no qual se apoia o ensino reflexivo onde a
prática e o formador se constituem na” chave “do currículo de formação
profissional e diz que” só uma concepção
monolítica da ciência, baseada em posições do mais ultrapassado positivismo,
pode ignorar ou recuar o estudo das situações incertas, únicas e conflituosas
da sala de aula “(p.113),
ressaltando o valor dos métodos etnográficos e qualitativos para estudar as
diversas situações da prática e do processo de construção do pensamento prático
docente.
Com
relação a isso, Demailly (1995), analisando os processos de formação contínua,
voltados para a influenciação de mudança, distingue na socialização de saberes
e do saber-fazer, dois tipos os formais
(procedimentos de aprendizagem desligados de atividade tal como está
socialmente construída); e os informais
(aprendizagem adquirida "por contato ou por imitação"). Nesse
sentido, ela classifica a aquisição do saber por quatro formas: "a universitária, que tem por finalidade
essencial a transmissão do saber e da teoria; a escolar, onde os professores têm de ensinar saberes que são
definidos por um programa oficial; a contratual,
caracterizada por uma negociação entre diferentes parceiros ou voluntários; e a
interativa-reflexiva, voltada para a
solução de problemas reais através de apoios técnicos" (p.150). Com base
em Gilles Ferry (1983), esta autora afirma que os produtos da ação pedagógica
podem ser especializados e reproduzidos num espaço de tensão entre dois
extremos a que chamou de "dramática (a improvisação) e a engenharia (o
transferível), o reprodutível, o esquema em torno do qual se realiza a ação” (p.153).
Com base nisso, ela hierarquiza os saberes profissionais em competências.
"Éticas (valores);
saberes científicos e críticos (que podem ser sistematizados); saberes didáticos
(aplicação das ciências humanas à transmissão e aquisição de um domínio do
saber escolar); competências dramáticas e
relacionais (competências corporais e
comportamentais); saberes e saber-fazer pedagógico (trabalho na sala de
aula, procedimentos como planos de aula e preparação de materiais e aplicação
de tecnologias); e competências organizacionais (metodologias de trabalho
coletivo)". (p.153-55; grifos do autor).
Supõe-se
que a possibilidade de melhor clarificar a noção de saber e de saberes pedagógicos
dêem-se a partir da análise da prática pedagógica, no âmbito das múltiplas
interações e representações concorrentes e dos múltiplos significados que lhes
são atribuídos e modificados no contexto de novas interações. O processo de produção de saberes pedagógicos
no interior das relações de interação e de construção de significados em sala
de aula está diretamente relacionados à posição social dos sujeitos, o papel
que desempenham e a forma como se apropriam destes saberes nos demais campos de
relações sociais, onde vivem, sentem, agem e transformam.
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