sábado, 28 de dezembro de 2019





A CONSTRUÇÃO DE SABERES PEDAGÓGICOS: DO COTIDIANO AO COTIDIANO ESCOLAR


THE CONSTRUCTION OF PEDAGOGICAL KNOWLEDGE: 
FROM DAILY TO SCHOOL DAILY

                                                                                 
José Ribamar Tôrres Rodrigues
Doutor em Educação pela USP
Mestre em Educação pela PUC/SP
Estágio em Formação de Professores no IUFM de DOUAI/ França
Estágio em formação de Professores em CUBA
Ex-Membro do Conselho Estadual de Educação/PI
Ex-Coordenador do Fórum Estadual de Educação
Membro do Banco de Avaliadores do MEC/INEP
TEL: (86) 99415-9958


José Ribamar Rodrigues Tôrres
PhD in Education from USP
Master in Education from PUC / SP
Internship in Teacher Training in the IUFM of DOUAI / France
Stage for Teacher training in Cuba
Former member of the State Board of Education / PI
Ex´-Coordinator of the State Education Forum
Member of Appraisers Bank MEC / INEP
TEL/whatsApp: (86) 99415-9958






RESUMO

            Este texto objetiva discutir categorias teóricas como habitus (Bourdieu), saberes (Tardif ; Gauthier), cotidiano (Heller), dentre outros, aplicáveis à análise e compreensão de práticas pedagógicas de docentes, especialmente professores rurais, tendo a sala de aula como espaço social onde ocorrem processos de construção e reconstrução de saberes e saberes pedagógicos.

ABSTRACT

This text aims to discuss theoretical categories such as habitus (Bourdieu), knowledge 
(Tardif; Gauthier), daily life (Heller), among others, applicable to the analysis and understanding 
of teaching practices of teachers, especially rural teachers, with the classroom as a space. where
 processes of construction and reconstruction of pedagogical knowledge and knowledge occur.

RESUMÈ

Ce texte vise à discuter des catégories théoriques telles que l'habitus (Bourdieu), la connaissance
 (Tardif; Gauthier), la vie quotidienne (Heller), entre autres, applicables à l'analyse et à la 
compréhension des pratiques pédagogiques des enseignants, en particulier des enseignants  
 ruraux, avec la classe comme espace. où se produisent les processus de construction et de 
reconstruction des connaissances pédagogiques et des connaissances.


RESUMEN
Este texto tiene como objetivo discutir categorías teóricas como habitus (Bourdieu), conocimiento
 (Tardif; Gauthier), vida cotidiana (Heller), entre otras, aplicables al análisis y la comprensión de las 
prácticas docentes de los docentes, especialmente los docentes rurales, con el aula como espacio. 
donde ocurren procesos de construcción y reconstrucción del conocimiento pedagógico y el 
conocimiento.




SOMMARIO
Questo testo mira a discutere categorie teoriche come habitus (Bourdieu), conoscenza 
(Tardif; Gauthier), vita quotidiana (Heller), tra gli altri, applicabili all'analisi e alla comprensione
 delle pratiche di insegnamento degli insegnanti, in particolare degli insegnanti rurali, con l'aula 
come spazio. dove avvengono processi di costruzione e ricostruzione di conoscenze e conoscenze 
pedagogiche.

ZUSAMMENFASSUNG

Dieser Text zielt darauf ab, theoretische Kategorien wie Habitus (Bourdieu), Wissen 
(Tardif; Gauthier), Alltagsleben (Heller) ua zu diskutieren, die für die Analyse und das 
Verständnis der Unterrichtspraktiken von Lehrern, insbesondere von ländlichen Laienlehrern,
 mit dem Klassenzimmer als Raum anwendbar sind. wo Prozesse der Konstruktion und 
Rekonstruktion von pädagogischem Wissen und Wissen stattfinden.
 
 
РЕЗЮМЕ
 
 
Этот текст направлен на обсуждение теоретических категорий, таких как габитус (Бурдье),
 знания (Тардиф; Готье), повседневная жизнь (Хеллер), среди прочего, применимых к анализу 
и пониманию педагогической практики учителей, особенно сельских учителей-мирян, с
 классной комнатой в качестве пространства. где происходят процессы конструирования и 
реконструкции педагогических знаний и знаний.
 
 
REZYUME
 
 
Etot tekst napravlen na obsuzhdeniye teoreticheskikh kategoriy, takikh kak gabitus (Burd'ye), 
znaniya (Tardif; Got'ye), povsednevnaya zhizn' (Kheller), sredi prochego, primenimykh k analizu i
 ponimaniyu pedagogicheskoy praktiki uchiteley, osobenno sel'skikh uchiteley-miryan, s klassnoy
 komnatoy v kachestve prostranstva. gde proiskhodyat protsessy konstruirovaniya i rekonstruktsii 
pedagogicheskikh znaniy i znaniy.





A sala de aula, como espaço social, representa um campo plural e permanente de construção de saberes a partir de interações e representações que constituem as estruturas de produção de saberes.  As interações incorporam significados gerados pelas representações e, estas, por sua vez, são reelaboradas pelas novas interações, criando novos significados, mediatizados pelo discurso de sujeitos situados em um determinado horizonte social, no caso, o espaço geográfico, da sala de aula da escola da sociedade.

Mais recentemente, vários estudos utilizam as abordagens do cotidiano, baseados principalmente nas teorias de Lefebvre, Lukács, Kosik (1967) e Agnes Heller (1977), e nas pesquisas de Patto (1991), Rockwell y Ezpeleta (1983) bem como nas contribuições da hermenêutica e da epistemologia genética.

O cotidiano da sala de aula do professor apresenta singularidades em relação àquilo que se passa em outros espaços educacionais. Tais singularidades correspondem a uma rede de relações do cotidiano que representam uma tradução reelaborada das mesmas em razão de uma determinada visão de classe e da história dos sujeitos que ali interagem.

As sociologias clássicas totalizantes como o positivismo, o marxismo e o funcionalismo no intuito de racionalizar a sistematização de macromodelos e macrossistemas sobre os aspectos sociais, ignoravam a dimensão dos eventos do cotidiano no plano sócio-econômico global, tal qual se refere Laura Bovone, (1996). É no espaço cotidiano que os agentes sociais estabelecem suas relações e constróem seus significados, que por sua vez justificam suas ações. Este processo de relações e significados representam as condições iniciais de elaboração e reelaboração de saberes sobre si mesmos, sobre sua prática e sobre a realidade onde vivem. Daí, tornar-se necessário conhecer os mecanismos pelos quais os sujeitos são motivados a se movimentar entre valores e realidade ou entre subjetivismo e objetivismo.

Diversos trabalhos enfatizam a idéia de mecanismos de mediação na atividade do sujeito frente à realidade, vinculadas a diferentes correntes teóricas.  O cotidiano escolar, de certa forma, sofre limitação das normas institucionais e sociais, mas alguns eventos que ocorrem ali demonstram uma independência relativa em relação a essas conformações, tendo em vista que tais eventos, gestados por subgrupos, assumem um sentido particular. Suas ações não parecem assim, tão óbvias para os demais elementos do campo. Para Bourdieu a noção de habitus como “estruturas estruturadas / estruturantes” permite a compreensão da geração de práticas e representações dos sujeitos na sua relação com a estrutura social.

Estudar as práticas pedagógicas do cotidiano escolar e da sala de aula de professor é procurar compreender dimensões e sentidos muito particulares das ações que ocorrem no contexto genérico social e educacional e como elas se articulam com a realidade mais ampla. Com relação a isso, Bueno diz que.

                     “... é necessário se ultrapassar o registro oficial para se chegar a uma história que, não documentada, repousa noutro lugar: nas práticas e nas concepções dos agentes. Nesta história acumulada na memória e no corpo dos que vivem, confluem sociedade e Estado, não de modo abstrato, mas com a concretude de indivíduos que se apropriam das prescrições características das instituições burocratizadas para materializar a instituição escolar no dia a dia".(p.43).

Desse modo, as características geográficas, a história dos sujeitos e a posição que ocupam na hierarquia social do lugar onde se situa a escola, produzem reflexos nas condições sócio econômicas, modos de ser, nas percepções sobre escola, trabalho e vida de professor e alunos. O cotidiano tem como principal característica à espontaneidade embora “nem toda a atividade cotidiana seja espontânea”, (Heller, 1987, p.300). Isso quer dizer que ele não é de todo imprevisível. Nas suas relações, embora os sujeitos partam de certas regras e posições sociais e institucionais, de tempo e espaço, previamente determinados, contrapõem-se a elas através de saberes, habilidades e valores, inseridos nas suas representações para a construção de novas relações que vão atender a expectativas pessoais, institucionais e sociais que antes de imprevisíveis são contraditórias, mas como mecanismo de defesa só deixam revelarem-se os resultados que assegurem o funcionamento coletivo que os legitima como grupo e como instituição.

Nesse sentido, Chizzotti (1992) defende que.

                     É preciso (...) investigar os rituais rotineiros que estão cristalizados na vida diária, esse movimento mecânico das ações que acabam constituindo o dia-a-dia, porque é neles que vamos encontrar a racionalidade subjacente da vida cotidiana das pessoas. Aquilo que se considera banal, inútil, desnecessário, rotineiro, absurdo (...) são esses atos triviais e banais que servem de base para fazer uma descrição elaborada do que as pessoas precisam, falam e compreendem (...) outro viés é considerar o cotidiano como campo residual da vida. (...) Se o cotidiano fica proscrito da vida ou considerado como rescaldo dela, fica também desterrado de todos os atos deliberados da vida e de toda a impossibilidade de impregnarmos de uma vontade consciente esses atos. E os sujeitos que são vistos nesse cotidiano estão no meio pobre, onde, como atores sociais, se tornam invisíveis e suas práticas inconseqüentes “(p. 89-95)”.

O cotidiano das práticas pedagógicas de professor e alunos revelam uma característica multicultural e multidisciplinar, ocupando espaços e tempos de ensino e aprendizagem diferentes dos espaços e tempos medidos e cronometrados pelo sistema oficial que em oposição ao cotidiano onde a lógica do tempo da aprendizagem e da ação docente têm uma dinâmica própria.  Neste aspecto, Lefebvre (1961), diz que há tempo social e tempos sociais distintos dos tempos biológicos, psicológicos, físicos e um espaço social diferente do espaço geométrico, físico e biológico e do espaço cotidiano que apresenta quatro dimensões distintas daquelas definidas por matemáticos e físicos: o tempo realizado, o previsto, o incerto e o imprevisível.

As práticas pedagógicas de professor em sala de aula se definem a partir de um espaço e tempo de vida cotidianos onde os sujeitos percebem o caráter cíclico de suas práticas, mas não percebem os diferentes tempos e espaços, geradores da história que presidem e dão diferentes sentidos a essas rotinas.
 
Na obra de Bourdieu, analisada por Renato Ortiz (1893, p. 8), são evidenciadas três premissas epistemológicas, quais sejam, o conhecimento praxeológico, o conceito de campo e a noção de habitus. Interessa, neste texto, a abordagem que faz Bourdieu sobre a noção de habitus como mediação entre o agente social e a sociedade.

Para Ortiz, (1983), Bourdieu enfatiza a importância de se estudar o modo de estruturação do habitus, através das instituições de socialização dos agentes que se entende, sejam os grupos sociais: família, religião, trabalho, escola, etc.

Para estudar um conjunto de saberes, habilidade e valores da estrutura da prática pedagógica do professor no trabalho de sala de aula, o conceito de habitus, enquanto conceito geral, parece não ser o suficiente bastante para desvendar as “tramas” das relações particulares de habitus construídos na dinâmica das interações e representações do cotidiano escolar, caracterizados pelo estilo pessoal que Bourdieu chama de “desvio codificado em relação ao estilo de uma época, uma classe ou um grupo social” ou “variante estrutural do habitus”. Tentando-se compreender estes habitus particulares da prática pedagógica do professor, agrega-se, aqui, a noção de habitus pedagógico que surgiu da reflexão do conceito de habitus de Bourdieu.  Desse modo, o habitus é particular e genérico por estar em toda atividade humana e em todo homem e o habitus pedagógico é, também, particular e genérico por estar em toda atividade educativa, especialmente na formação de professores e na atividade pedagógica de cada professor. Nesse sentido, as práticas pedagógicas do professor têm, simultaneamente, um caráter particular e genérico porque se estruturam a partir de habitus por eles apropriados na trajetória familiar, estudantil, profissional, exteriorizados na sala de aula, que se constitui num espaço privilegiado, onde fragmentos de cotidiano e de história oficial tecem-se para a construção de uma história particular.

Assim, considerando-se a sala de aula com um locus de relações de força, os habitus pedagógicos[1] são heterogêneos, em escala e sentido, assumindo funções e significados heterogêneos neste espaço de luta ( escola versus cotidiano) para fazer prevalecer um modo de fazer. O habitus, no sentido empregado por Bourdieu, parece não poder ser, simplesmente, transplantado para a situação das práticas do cotidiano escolar como se fosse possível aplicá-lo a todos os eventos que ali ocorrem e como se todos se dessem a nível genérico, sem que particularidades específicas estivessem na natureza destas práticas docentes.

A teoria do conhecimento praxeológico de Bourdieu parece não estar preocupada como mudar as estruturas sociais, mas como os sujeitos se adequam a elas. Parece acreditar que as ações dos indivíduos são produtos de fatores sociais que influem sobre e através deles, ignorando os fatores psicológicos contidos nas ações sociais elaboradas por processo de interpretações dos sujeitos, como defendem os interacionistas.  Em conseqüência, as premissas sobre transformação social aparecem, apenas implícitas ou fugazes (Renato Ortiz, 1994). Embora não desenvolva uma teoria da transformação social, o conceito de habitus não se reduz à apropriação de estruturas anteriores para serem aplicadas no cotidiano do indivíduo; não se refere a um sentido “repetitivo, mecânico e automático” como explica o próprio autor (1983, p. 105), onde expõe que os habitus tendem a uma lógica de reprodução e transformação objetivas. Assim, Bourdieu imprime ao conceito de habitus um processo dialético onde, a “interiorização da objetividade e exteriorização da interioridade”, embora se dêem de forma subjetiva, não pertencem somente à esfera individual, uma vez que os habitus de referência do grupo ou da classe são garantidos à proporção que estes indivíduos “internalizem representações objetivas” de acordo com as “posições sociais que ocupam”.

Com isso, pode-se compreender uma grande contradição nas relações profissionais e sociais da prática pedagógica de professores, especialmente de professor. Enquanto profissionais, eles “internalizam representações “objetivas”(habitus pedagógicos) através do currículo escolar e do processo de formação que expressam uma outra visão de classe. Enquanto indivíduos, pertencentes a um outro grupo social, eles reinterpretam, através da prática pedagógica, essas “representações objetivas” dos currículos escolares e da formação, por meio de habitus (que Bourdieu explica como “estruturas estruturadas dispostas a funcionarem como estruturas estruturantes”) incorporados nas relações de âmbito particular de classe, isto é, que podem gerar e ‘regular’ novas práticas independente de regras orientadas para um fim”.

Isso implica que, o professor, no processo de formação e como profissional, internaliza o genérico do quotidiano social para exteriorizá-lo pelo particular do cotidiano de classe. Talvez, se possa concluir disso que o habitus das relações particulares de classe, também contido no habitus genérico do social mais amplo, cunhe no professor uma identidade tendente a determinar a constituição de habitus pedagógicos ulteriores.

Nesse sentido, tenta-se articular, apoiando-se nos conceitos de habitus e de cotidiano, uma análise descritiva de saberes, práticas e representações construídas e apropriadas pelo professor na prática pedagógica de sala de aula.

Para Raymond (apud Tardif e Gauthier, 1996), em pesquisas recentes, não está clara a noção de saber, por isso é necessário distinguir saberes de certezas, crenças e habitus, no sentido utilizado por Bourdieu que assim o entende: “esquemas de ação e pensamento interiorizados no quadro da socialização profissional ou até no da história escolar ou mesmo familiar dos professores”(p. 26). Neste aspecto, embora pertinente à idéia de não clareza da noção de saber, entende-se parcial o conceito de habitus empregado por Tardif e Gauthier, considerando-se que Bourdieu não toma este conceito, como já explicitado anteriormente, apenas, como um elemento mecânico, repetitivo (estrutura estruturada), mas como gerador de habitus ulteriores (estrutura estruturante), incorporando a idéia de reprodução e de possível transformação.

Para Tardif, Lessard e Lahaye (1991), o saber docente é um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação profissional, dos saberes das disciplinas dos currículos e da experiência.

Com base em Tardif e Gauthier (1996), a questão do saber, a partir de perspectiva histórica, refere-se a pesquisas do início do século, centradas nos traços de personalidade do professor; com relação aos problemas epistemológicos, as pesquisas consideram a sala de aula como singularidade e generalização, visando estabelecer uma regra de funcionamento; os problemas políticos caracterizam-se pela implantação de ações governamentais com base em ideologias geradas por pesquisas, relacionando qualidade da educação à competência dos professores; e problemas metodológicos expressos na limitação das sínteses de pesquisas gerados pela 'mega-análise' - síntese das sínteses - que induzem os resultados a procedimentos matemáticos, voltados para resultados obtidos.

Nos anos de 1980 e 1990, o movimento de profissionalização determinou a crença de que a atividade docente não poderia se profissionalizar nem alcançar melhor desempenho do aluno se não se fundamentasse em saberes especializados e para isso seria necessário se apoiar em pesquisas para determinar a base de conhecimento do professor.

As questões, no entanto, remontam aos anos pós Segunda Guerra, quando pesquisas tentam medir a eficácia do ensino não mais por traços de personalidade, mas pelo rendimento de diferentes métodos utilizados em sala de aula.  Os efeitos dos métodos eram confundidos com a diferença de utilização dos mesmos pelo docente, uma vez que a base era o estudante e não o docente na comparação entre salas de aula.
 
Nas décadas de 1950 e 1960 foram realizados estudos a partir de observações mais centradas nas atividades pedagógicas, mas não eram relacionadas com o sucesso escolar. Nos anos setenta, evidenciaram-se as abordagens processo-produto, etnometodológicas e cognitivas voltadas para o desempenho dos alunos, procurando saber se isto era determinado pelo docente, pela classe social ou por programas escolares.     

Para estes autores, o problema epistemológico consiste em considerar, ao mesmo tempo, a sala de aula como uma atividade singular que não pode conduzir a uma generalização e, também, como uma estrutura estável que possa ser estudada e, a partir daí, elaboradas leis ou regras de funcionamento do trabalho docente. Isso recomenda prudência na utilização de resultados de pesquisas, que devem, apenas, fornecer informações ao docente. Em seus estudos, Tardif e Gauthier levantam problemas políticos da pesquisa científica, em relação aos Estados Unidos, dizendo que os mesmos foram evidenciados a partir do relatório do chamado Grupo Holmes onde se afirmava que para reformar a educação era necessário tornar os professores mais competentes.  Com base nessa conclusão, grupos políticos e econômicos dominantes teriam conseguido transferir a crise da educação para a escola e, principalmente, para os professores.

Com relação ao aspecto metodológico, Tardif e Gauthier (1996) afirmam que os trabalhos que visam sintetizar os resultados das várias pesquisas são limitados por problemas metodológicos gerados pela “mega-análise. Para eles, isto não pode reduzir-se a procedimentos matemáticos, pois deve incluir principalmente discussões sobre os resultados obtidos. Os problemas são gerados a partir dos objetivos de resultados de pesquisas de ordem prática, ou seja, visam incorporar tais resultados a programas de formação docente. Isto, porém, nem sempre ocorre, uma vez que este é muito mais um processo deliberativo e político. Tais pesquisas caracterizam-se pelo aspecto sócio–histórico na medida em que procuram situar os saberes como produtos sociais e permitem apreender suas transformações; e, pelo aspecto sócio–epistemológico, na medida em que não se limitam as análises de saberes, a dimensões internas (formais, lógicas, cognitivas), mas também as insere num sistema de práticas simbólicas, vinculadas ao sistema de ações sociais.  

Metodologicamente, esses estudos orientam-se pelos princípios da pluralidade e evolução do saber, vinculando-se a outros aspectos escolares, compreendidos a partir do contexto em que se dão, do exercício da profissão e determinado pela natureza do trabalho docente.

Maurice Tardif, Claude Lessard e Louise Lahaye (1991), consideram que a prática docente integra diferentes saberes: os saberes das disciplinas (materiais escolares e conteúdos), os saberes curriculares (programas das disciplinas), os saberes profissionais (ciências da educação e pedagogia), os saberes da experiência ou saberes práticos (constituídos ou absorvidos na ação quotidiana), e os saberes culturais (cultura geral de cada docente). No entanto alertam que diferentes pesquisas apontam diferentes tipologias de saberes. Estes autores discutem a relação dos docentes com os saberes, lembrando que nas sociedades pré-modernas as tarefas de produção e transmissão do saber se integravam em um só sujeito. No entanto, com o desenvolvimento do capitalismo há uma separação cada vez maior entre a produção de saberes e a formação nos saberes. Como conseqüência, dizem eles que.

                     "Se os cientistas são valorizados em sua atividade de produção de conhecimento, os docentes são, progressivamente, subvalorizados em sua tarefa de ensino. Concebem-se os docentes como técnicos e executores aos quais competem dominar os saberes e as técnicas para sua transmissão" (p.217-18 ).

Entende-se pertinente esta crítica visto que traz à tona a idéia de saber plural no qual o professor não pode ser reduzido à tarefa de execução. Na sua prática, ele adita, aos saberes que lhes são impostos, a sua experiência, construindo, portanto, um novo saber embora na maioria das vezes não se dê conta disso.  

O surgimento das ciências educativas, segundo esses mesmos autores, levam para esta atividade, a fundamentação da pedagogia moderna, especialmente dos saberes psicológicos e psicopedagógicos, os quais produzem um saber cada vez mais especializado e técnico; por outro lado, o centro do ensino se desloca do professor para o aluno como resultado do surgimento das diferentes tendências pedagógicas, como a Escola Nova, já que não se trata de aprender conteúdos, mas de aprender a aprender.

Caldeira tipifica alguns saberes docentes: a coeducação que se refere a estratégias para superar estereótipos na questão sexual (menina/menino); organização do tempo, através dos planos e projetos de trabalho, superando processos tradicionais vigentes; organização do material em pastas em uma seqüência de atividades; organização da interação que se refere a um conjunto de regras geradas ou negociadas; o processo de tomada de decisão, através de explicação aos alunos e envolvendo-os no mesmo; o trabalho coletivo na sala de aula quando o docente tenta ser democrático sem ser parcial, promovendo a participação de todos; a conduta reflexiva do aluno ante o processo de aprendizagem que procura tornar os estudantes em vez de executores, reflexivos, considerando que aprender é incorporar, relacionar, argumentar.

O objetivo central do trabalho docente, segundo esta autora, é aprender a aprender para que os alunos tenham consciência do seu próprio processo de aprendizagem e aprendam a utilizar diferentes estratégias; a promoção da igualdade entre meninos e meninas, em termos de linguagem e gênero, como elementos da diversidade e superação de estereótipos sociais; interação com o aluno com base em informações obtidas na família, procurando intervir segundo as características de cada um; articulação dos conteúdos escolares, procurando transformar a informação em conhecimentos, trabalhando fatos, conceitos, procedimentos e atitudes.
Na prática de sala de aula, o processo interativo professor-aluno, aspectos tácitos internos e externos entram em concorrência com o que determina a norma institucional. As relações se orientam menos pela origem sócio econômica que pelos aspectos subjetivos de laços familiares e pelos aspectos objetivos de interesses sócio-políticos. A própria representação que o professor tem dele e de sua atividade profissional determina os termos da relação com os alunos e com a comunidade onde trabalha. O professor percebe os critérios tácitos que a comunidade adota para a “consagração” de um dos seus membros, especialmente do professor, e por isso adota estratégias de persuasão nem sempre coerentes com a norma institucional.

É comum os alunos tratarem o professor tomando a bênção e chamando-o de tio/tia, madrinha/padrinho. O professor, em contra-partida, incorpora estas representações familiares como parte do papel que ele deve desempenhar, através de várias formas, dentre outras, não sendo rígido com o aluno; sendo tolerante quando ele não faz o exercício; quando esquece o material escolar; quando excede nas condutas ou conversas durante as aulas; quando copia para os alunos a tarefa no caderno deles; quando o ajuda a responder exercícios e até mesmo responder por ele; quando compra, com seu pequeno salário, material escolar, remédio e até roupas para o aluno. Pesquisa sobre os professores revelou que ele dá muita importância à necessidade de conquistar a amizades dos alunos como fundamental, não prioritariamente para favorecer o processo de ensino e aprendizagem, mas, de modo tácito, para atrair a admiração dos familiares e garantir sua posição de respeito na comunidade e até mesmo o seu emprego.

O seu prestígio, na comunidade, depende mais das virtudes pessoais, subjetivas, que possam ser reconhecidas, que das virtudes intelectuais que possa demonstrar. A atuação do professor como pessoa e suas posições político-partidárias definem o espaço social, político e profissional que lhe será reservado “como recompensa”, pela comunidade. Se os mestres-escola eram controlados pelo poder eclesiástico no século XVI, (Nóvoa, 1986), nos dias de hoje, no Brasil, e com mais ênfase em regiões menos desenvolvidas dentre as quais se insere o Piauí, os mestres-escola, cuja nomenclatura modernizada veio tornar-se conhecida como professor, passam ao controle do poder político local, revelados nos processos de recrutamento de professores para as escolas rurais, embora tal mecanismo atravesse um momento de transição através da implantação do concurso público.

Por outro lado, se o professor é parte de grupos dominantes do lugar, este espaço lhe é concedido independente das práticas de relações que estabeleça, quer no espaço profissional quer no espaço social. Os alunos, em geral, são filhos, sobrinhos ou com alguma relação de parentesco com o professor, ou filhos de amigos, compadres e conhecidos da comunidade. A interação do professor com os alunos tem estreita relação com a história das relações do professor com os grupos familiares ou políticos a que estes alunos estão vinculados.

Assim, a história das relações de interação e das práticas docentes apoiam-se em diversos saberes construídos em variadas circunstâncias culturais. Nesse sentido, Maria Luisa Simoni (1991), estudando a prática docente, analisa como a construção e a circulação de saberes docentes ocorrem no contexto escolar em meio às condições de trabalho coletivo de professores e alunos, de recursos materiais e estratégicos, utilizados pelo professor, de intercâmbio de materiais entre eles, de relação com as famílias, da carga de trabalho do professor, centrada mais em atividades extra classe que de sala de aula e das formas de organização de tempo e espaço em classe.

A autora discute as condições específicas do trabalho docente de 1o grau e as diversas propostas pedagógicas existentes na escola onde o professor constrói individual e coletivamente recursos de aprendizagem utilizados no seu trabalho em classe. Seu estudo mostra que tanto as práticas geradas em outros momentos históricos da escola quanto às dificuldades dos professores em reconstruir suas práticas de trabalho se devem, em parte, às condições materiais nas quais ocorrem. Ela sustenta que os professores aprendem a usar os recursos próprios da escola, atuando de acordo com a forma como esta se organiza e, se apropriando de seus costumes, tradições, enfim, aprendem a dirigir-se na estrutura da vida escolar. Todo professor para ter este desempenho tem de se apropriar, também, dos usos de linguagem adequados a cada nível em que trabalham.

Com base nisso, vale acrescentar que não se pode perder de vista que o professor também traz para o âmbito da vida e da cultura escolar representações, concepções, modos de fazer e de ser que se encontram diluídos na ação coletiva fora da escola.

Os estudos até aqui apresentados têm como ponto de partida a apropriação e a construção do saber docente, evidenciando o cotidiano escolar como processo social e os saberes docentes como produto deste processo. Enquanto Tardif, Gauthier, Lessard e Lahaye (1991) preocupam-se com saberes de diferentes natureza: normativos, pragmáticos, tradicionais e tácitos, tipificando-os em curriculares, disciplinares, profissionais, culturais e da experiência, para determinar uma base de conhecimento docente, Caldeira, embora utilizando este referencial, estabelece subtipos destes saberes na prática pedagógica.

Ambos se diferenciam de Simoni, que embora admitindo que a construção e circulação de saberes docentes se dão pelo trabalho coletivo, subordina esse processo às condições materiais nas quais ocorrem, ou seja, à instituição escolar, subestimando assim, a influência decisiva, nesse processo, da rede de representações e interações dos elementos envolvidos no trabalho escolar, provavelmente, capazes, em algumas circunstâncias, de transformar a instituição, independente de suas condições materiais. 

Os estudos de Brandão(1983), Therrien (1991), De Vargas (1995) e Abras (1998), dentre outros, evidenciam a escola rural como transplantação do modelo de escola urbana.  Observou-se, no entanto, na área pesquisada, que isto só é válido enquanto percepção de escola rural do ponto de vista formal.  No interior das relações que se dão na escola rural, surge uma outra escola que se orienta, em grande parte, por leis consuetudinárias em vez de leis formais do sistema de ensino; substitui, em parte as relações hierárquicas e profissionais pela divisão de responsabilidades, por critérios subjetivos, familiares; substitui, em parte, os conteúdos curriculares e métodos formais pelos conteúdos do cotidiano e pelos modos de fazer legitimados pela experiência.

O jogo de relações ocultas do trabalho docente em sala de aula constitui-se num espaço simbólico de autodefesa que envolve e camufla um conjunto de relações e significados que se constrói no cotidiano, entre o real e o aparente, entre o legal e o informal, entre o documentado e o não documentado. Nem mesmo como organização a escola rural parece reprodução total da escola urbana, caracterizando-se por uma estrutura híbrida, composta de elementos formais e informais. Na verdade, a aparência da organização escolar rural semelhante à da escola urbana impõe-se como necessária para ser aceita e reconhecida legalmente pela sociedade como parte de um sistema escolar oficial.

Embora no aspecto formal pareça homogeneizada, através de leis, fichas, regimentos, que ao mesmo tempo em que tentam engessar o cotidiano escolar criam espaços para o seu questionamento, as práticas quotidianas são altamente diversificadas, constituindo-se, cada qual de uma dinâmica própria e identificando-se consigo mesmas e com as histórias das culturas que as criaram.  A organização burocrática e o currículo da escola rural, como ocorre na prática, rompem como o modelo técnico-racional da proposta oficial.    
A mesma relação de afastamento entre a proposta de escola urbana e a realidade rural observa-se, também, em relação à escola urbana e às periferias das cidades.  Ao contrário do que parecem mostrar as análises dos vários estudos aqui apresentados, esta defasagem não é uma característica exclusiva da educação urbano-rural. Há indícios de que, principalmente, a rápida expansão urbanística, com a formação de grande concentração populacional nas zonas periféricas das cidades brasileiras, em sua grande maioria proveniente do meio rural, tornou o problema da distância dos conteúdos em relação à cultura destas populações, comum tanto ao espaço urbano quanto ao rural. É importante ressaltar que mesmo antes desta explosão migratória do campo para a cidade a escola já revelava indícios desta característica de ignorar a cultura da população quanto aos diversos estratos sociais do espaço urbano.

Certamente, o professor só será capaz de transpor saberes construídos para sua atividade pedagógica se ele for capaz de superar a prática intuitiva (empírica), articulando-a com uma prática sistematizada e reflexiva. Assim, a valorização da experiência constitui-se num elemento de superação dos processos de construção de saberes e, ao mesmo tempo ponto de partida e de chegada de sistematização e avaliação de sua prática numa perspectiva de mudança.

No entanto, tal processo de construção e de sistematização de saberes exige experiência que para Pierre Dominicé (1990) é imprescindível à existência pessoal, social e profissional e depende da consciência de que o sujeito elabora o seu saber durante sua vida e que a "noção de experiência mobiliza uma pedagogia interativa e dialógica". Nesse sentido, os saberes da experiência definem um espaço profissional e social, constituído por um ciclo de práticas que representam as idéias pedagógicas de uma época, mas também atualizadas pelas experiências individuais e coletivas (jurisprudência pedagógica).  Desse modo, diz Nóvoa, (1995), o intercâmbio entre professores é essencial para solidificar conhecimentos oriundos da prática profissional e que a produção de saberes e valores refletem na construção de uma nova cultura profissional dos docentes, uma vez que "a profissionalização do saber na área das ciências da educação tem contribuído para desvalorizar os saberes experienciais e as práticas dos professores” (p. 27).

Shulman, (1986), citado por Carlos García, in Nóvoa (1995), refere-se a diferentes tipos de conhecimento dos professores: "o proposicional, o de casos e o estratégico". O proposicional consiste no conhecimento da investigação didática baseada nas relações casuais. Tais conhecimentos contém princípios que derivam da pesquisa empírica sobre a eficácia docente. As máximas são os conhecimentos adquiridos na prática e as normas referentes a "valores, princípios ideológicos, filosóficos, de justiça e eqüidade” (p.57-8).  O conhecimento de casos refere-se a fatos concretos específicos de prática, ligados á experiência pessoal. Tal conhecimento aparece sob forma de protótipo ou "aplicação de princípios teóricos precedentes ou situações práticas e parábolas oriundas da comunicação de valores e normas referentes aos mitos profissionais". O conhecimento estratégico refere-se ao que o professor constrói diante de situações conflituosas.

Krogh, Crews, (1989) e Ross, (1987) classificam três tipos de atitudes necessárias ao ensino reflexivo, já defendido por Dewey nos anos trinta, que são: a mentalidade aberta que consiste na "ausência de preconceitos, de parcialidade e de qualquer hábito que limite à mente e a impeça de considerar novos problemas e de assumir novas idéias"; a integridade e a harmonia do que se defende; e o entusiasmo que se refere à predisposição para encarar a atividade com curiosidade
Garcia, (1995), com base em Zeichner & Liston (1987), aponta três tipos de reflexão ou de análise da realidade imediata, quais sejam, a técnica, aquela que fazemos das situações explícitas; a prática, que consiste no planejamento do que se vai fazer e na reflexão do que se realizou; e a crítica, a análise ética e política da própria prática.

Nesse sentido, o mesmo autor identifica quatro formas de reflexão: a instrospecção, aquela voltada para a reflexão interiorizada de pensamentos e sentimentos desvinculados da ação quotidiana; o exame, que consiste na alusão do professor a eventos realizados ou que poderão ser realizados; a indagação leva o professor a analisar a sua prática e identificar elementos para o aperfeiçoamento; a espontaneidade, que consiste na ação intelectual de análise do professor durante o seu trabalho pedagógico onde ele pode redefinir as ações e implementá-las.

Gómez, (1995), relacionando a educação escolar e a atuação docente, mostra que há defasagem entre a expansão escolar, nas sociedades industrializadas, e, em conseqüência, o aspecto técnico da ação docente, a racionalidade técnica, a racionalidade prática e o modelo técnico e reflexivo de formação docente.

Este mesmo autor, com base em Yinger (1986), afirma que a partir dos anos cinqüenta a tecnologia da educação apoiou-se na psicologia do comportamento, responsável pela imagem do professor como técnico especializado cuja função é aplicar regras oriundas do conhecimento científico sistematizado. O processo de formação de professores tem sido realizado com base na concepção "linear e simplista, apoiado no componente científico-cultural (conteúdos) e no psicopedagógico (como atuar em sala de aula)". Critica a racionalidade técnica que defende a "aplicação do conhecimento e do método científico à análise da prática e à construção de regras que regulem a intervenção do professor". Para ele, na "tradição positivista, a primazia do contexto da justificação sobre o contexto da descoberta, forçou a investigação e a intervenção prática a se ajustarem aos padrões que validam, a priori, o conhecimento científico ou as suas aplicações tecnológicas”.

Diz, ainda, Gómez, com base em Yinger e Shön (1983), que o profissional depende da capacidade de lidar com realidades diversificadas e de resolver problemas práticos.

 Desse modo, a prática pode tornar-se repetitiva e o "conhecimento na ação", mecânico, originando-se a reprodução automática de sua aparente competência prática. Para ele, se o professor reflete na ação e sobre a ação, "converte-se num investigador na sala de aula. Afastado da racionalidade instrumental, o professor não depende de técnicas, regras e receitas derivadas de uma teoria externa, nem das prescrições curriculares impostas do exterior da escola pela administração” (p.105-6). Desse modo, levando-se em conta o pensamento prático do professor, isto requer que se reveja a "natureza do conhecimento acadêmico, dos princípios e métodos de investigação na ação e sobre a ação, o papel do professor como profissional e os princípios, conteúdos e métodos de sua formação". Este pensamento prático, para ele, "não pode ser ensinado, mas pode ser aprendido (p.112). A Partir da prática pode o professor construir um pensamento prático no qual se apoia o ensino reflexivo onde a prática e o formador se constituem na” chave “do currículo de formação profissional e diz que” só uma concepção monolítica da ciência, baseada em posições do mais ultrapassado positivismo, pode ignorar ou recuar o estudo das situações incertas, únicas e conflituosas da sala de aula “(p.113), ressaltando o valor dos métodos etnográficos e qualitativos para estudar as diversas situações da prática e do processo de construção do pensamento prático docente.

Com relação a isso, Demailly (1995), analisando os processos de formação contínua, voltados para a influenciação de mudança, distingue na socialização de saberes e do saber-fazer, dois tipos os formais (procedimentos de aprendizagem desligados de atividade tal como está socialmente construída); e os informais (aprendizagem adquirida "por contato ou por imitação"). Nesse sentido, ela classifica a aquisição do saber por quatro formas: "a universitária, que tem por finalidade essencial a transmissão do saber e da teoria; a escolar, onde os professores têm de ensinar saberes que são definidos por um programa oficial; a contratual, caracterizada por uma negociação entre diferentes parceiros ou voluntários; e a interativa-reflexiva, voltada para a solução de problemas reais através de apoios técnicos" (p.150). Com base em Gilles Ferry (1983), esta autora afirma que os produtos da ação pedagógica podem ser especializados e reproduzidos num espaço de tensão entre dois extremos a que chamou de "dramática (a improvisação) e a engenharia (o transferível), o reprodutível, o esquema em torno do qual se realiza a ação” (p.153). Com base nisso, ela hierarquiza os saberes profissionais em competências.

                     "Éticas (valores); saberes científicos e críticos (que podem ser sistematizados); saberes didáticos (aplicação das ciências humanas à transmissão e aquisição de um domínio do saber escolar); competências dramáticas e relacionais (competências corporais e comportamentais); saberes e saber-fazer pedagógico (trabalho na sala de aula, procedimentos como planos de aula e preparação de materiais e aplicação de tecnologias); e competências organizacionais (metodologias de trabalho coletivo)". (p.153-55; grifos do autor).

Supõe-se que a possibilidade de melhor clarificar a noção de saber e de saberes pedagógicos dêem-se a partir da análise da prática pedagógica, no âmbito das múltiplas interações e representações concorrentes e dos múltiplos significados que lhes são atribuídos e modificados no contexto de novas interações.  O processo de produção de saberes pedagógicos no interior das relações de interação e de construção de significados em sala de aula está diretamente relacionados à posição social dos sujeitos, o papel que desempenham e a forma como se apropriam destes saberes nos demais campos de relações sociais, onde vivem, sentem, agem e transformam.

Bibliografia
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 NÓVOA, Antonio. (Coord.). Os professores e a sua formação. Lisboa,
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SCHÖN, Donald.  Educating the reflective practitioner. San Francisco,
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SCHÖN, Donald. Formar professores como profissionais reflexivos. In
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       professores. Fundamentos e epistemologia. Seminário de  pesquisa
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ZEICHNER, Ken. Novos Caminhos para o practicum: uma perspectiva
       para os anos 90. In Os professores e sua formação. Lisboa, Dom
       Quixote, 158p.,1995.
WEREBE, Maria José Garcia. Grandezas e misérias do ensino brasileiro.
       São Paulo, Difusão Européia do Livro, 246p.,1963.





[1] Belmira Bueno. Autobiografias e Formação de Professores. Tese Livre Docência. USP.1996, p. 29.

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