quinta-feira, 19 de novembro de 2015

A ESCOLA DO CAMPO : UM JOGO ENTRE ESPERANÇA E RESISTÊNCIA

THE FIELD SCHOOL : A GAME BETWEEN HOPE AND STRENGTH

José Ribamar Tôrres Rodrigues
Doutor em Educação pela USP
Mestre em Educação pela PUC/SP
Estágio em Formação de Professores no IUFM de DOUAI/ França
Estágio em formação de Professores em CUBA
Ex-Membro do Conselho Estadual de Educação/PI
Coordenador do Fórum Estadual de Educação
Membro do Banco de Avaliadores do MEC/INEP.

José Ribamar Rodrigues Tôrres
PhD in Education from USP
Master in Education from PUC / SP
Internship in Teacher Training in the IUFM of DOUAI / France
Stage for Teacher training in Cuba
Former member of the State Board of Education / PI
Coordinator of the State Education Forum
Member of Appraisers Bank MEC / INEP.


Discute-se neste texto os fatores que contribuem para a negação do Direito do acesso a uma educação de qualidade, a negação da cidadania e a luta da população da área rural para superação desse histórico processo de exclusão. Neste contexto, mostram-se como as relações sociais e político-econômicas reforçam adominação e em consequência manutenção do poder colonizador de uma parcela da aristocracia nacional, aliada a grupos de interesses internacionais e insustentável situação da desigualdade no Brasil. Neste contexto, insere-se o papel reprodutor da educação escolar e a atuação do professor como mero instrumento embora inconsciente, da legitimação de uma aparente sociedade democrática.



It is argued in this paper the factors that contribute to the denial of the right of access to quality education , denial of citizenship and the struggle of the rural population to overcome this historical process of exclusion . In this context , it appears as the social , political and economic relations reinforce the domination and consequently maintaining the colonizing power of a portion of the national aristocracy , combined with international interests groups and unsustainable inequality in Brazil . In this context , is part of the reproductive role of education and the role of the teacher as a mere instrument if unconscious , the legitimacy of an apparent democratic society.



Il est soutenu dans ce document les facteurs qui contribuent à la négation du droit d'accès à une éducation de qualité , le déni de la citoyenneté et de la lutte de la population rurale de surmonter ce processus historique de l'exclusion . Dans ce contexte , il semble que les relations sociales , politiques et économiques renforcent la domination et de maintenir par conséquent la puissance colonisatrice d'une partie de l'aristocratie nationale , combiné avec des groupes d'intérêts internationaux et l'inégalité insoutenable au Brésil . Dans ce contexte , fait partie du rôle de la reproduction de l'éducation et le rôle de l'enseignant comme un simple instrument si elle est inconsciente , la légitimité d'une société démocratique apparente .


Se argumenta en este trabajo los factores que contribuyen a la negación del derecho de acceso a una educación de calidad , la negación de la ciudadanía y la lucha de la población rural para superar este proceso histórico de exclusión. En este contexto , aparece como las relaciones sociales , políticas y económicas refuerzan la dominación y en consecuencia el mantenimiento de la potencia colonizadora de una parte de la aristocracia nacional, combinado con grupos de interés internacionales y la desigualdad no sostenible en Brasil. En este contexto, es parte de la función reproductiva de la educación y el papel del profesor como un mero instrumento si está inconsciente , la legitimidad de una sociedad democrática aparente.


Si sostiene in questo lavoro i fattori che contribuiscono alla negazione del diritto di accesso a un'istruzione di qualità , la negazione della cittadinanza e la lotta della popolazione rurale per superare questo processo storico di esclusione . In questo contesto , appare come le relazioni sociali , politiche ed economiche rafforzano il dominio e di conseguenza il mantenimento della potenza colonizzatrice di una parte dell'aristocrazia nazionali, assieme interessi internazionali gruppi e disuguaglianza insostenibile in Brasile. In questo contesto , fa parte del ruolo riproduttivo dell'istruzione e il ruolo dell'insegnante come un mero strumento se inconsapevole , la legittimità di una società democratica apparente .


Es wird in diesem Papier die Faktoren, die zur Verweigerung des Rechts auf Zugang zu qualitativ hochwertiger Bildung , Aberkennung der Staatsbürgerschaft und dem Kampf der ländlichen Bevölkerung , um diese historischen Prozess der Ausgrenzung zu überwinden beitragen argumentiert . In diesem Zusammenhang scheint es, als die sozialen, politischen und wirtschaftlichen Beziehungen stärken die Herrschaft und damit die Aufrechterhaltung der Kolonialmacht auf einen Teil des nationalen Aristokratie , kombiniert mit internationalen Interessen -Gruppen und nicht nachhaltig Ungleichheit in Brasilien. In diesem Zusammenhang ist ein Teil der reproduktiven Rolle der Bildung und die Rolle des Lehrers als ein bloßes Instrument , wenn unbewusst, die Legitimität einer scheinbaren demokratischen Gesellschaft.


Он утверждал, в этой статье факторов, которые способствуют к отказу от права на доступ к качественному образованию , отказ в предоставлении гражданства и борьбы сельского населения для преодоления этого исторического процесса отчуждения . В этом контексте , похоже, как социальные, политические и экономические отношения укрепить господство и, следовательно, поддержания колонизации силу части национальной аристократии , в сочетании с международными групп интересов и неустойчивого неравенства в Бразилии. В этом контексте , является частью репродуктивной роли образования и роли учителя как простой инструмент , если бессознательное , законность очевидного демократическом обществе .
Onutverzhdal, vetoystat'yefaktorov, kotoryyesposobstvuyutkotkazuotpravanadostupkkachestvennomuobrazovaniyu ,otkazvpredostavleniigrazhdanstvaibor'bysel'skogonaseleniyadlyapreodoleniyaetogoistoricheskogoprotsessaotchuzhdeniya . Vetomkontekste ,pokhozhe, kaksotsial'nyye, politicheskiyeiekonomicheskiyeotnosheniyaukrepit' gospodstvoi, sledovatel'no, podderzhaniyakolonizatsiisiluchastinatsional'noyaristokratii , vsochetaniismezhdunarodnymigruppinteresovineustoychivogoneravenstvavBrazilii. Vetomkontekste ,yavlyayetsyachast'yureproduktivnoyroliobrazovaniyairoliuchitelyakakprostoyinstrument , yeslibessoznatel'noye , zakonnost' ochevidnogodemokraticheskomobshchestve .




A escola rural organiza-se, aparentemente, pelos mesmos critérios da escola urbana, com turnos pela manhã e pela tarde e, raramente, à noite, em razão da falta de energia elétrica. A estrutura hierárquica embora prevista, na maioria dos casos não há diretorpor terem as escolas, quase sempre uma sala de aula e muitas dela não têm nem mesmo merendeira e zeladora cujas funções são acumuladas pela professora.

A administração do sistema municipal de ensino éexercida pela Secretaria Municipal de Educação, composta de secretário, coordenação pedagógica e pessoal administrativo.  Embora seja uma unidade administrativa, as secretarias não controlam o orçamento a elas previsto por lei, nem tomam decisões cujas atividades são exercidas pelo prefeito.

A organização da escola rural decorre de uma política nacional centralizada na qual os estados, especialmente do nordeste, seguem, via de regra, os projetos do Ministério da Educação. Os Estados, para receberem estes recursos, se obrigam a planejar de acordo com as linhas de financiamento do MEC. Este tipo de política central, de um lado, obriga os Estados a se organizarem, a planejar as ações educacionais, mas de outro lado, favorece a que o Estado não desenvolva um planejamento educacional próprio para suas reais necessidades e, ainda, influencia no seu descomprometimento com uma política educacional.  O mesmo ocorre em relação ao município. A imposição de uma política educacional verticalizada estabelece uma camisa de força para a ação educativa.

Em nível municipal, as Secretarias de Educação recebem programações curriculares da Secretaria Estadual de educação e os livros didáticos do Ministério da educação. Este processo se reproduz na ação da secretaria municipal comos professores, distribuindo materiais prontos para serem executados em sala de aula. Todas essas orientações verticais tendem a estabelecer uma padronização no funcionamento escolar, ignorando as especificidades físico- materiais e de recursos humanos.
Muitas das políticas educacionais impostas à escola rural, além de não haver condições materiais e humanas para implantá-las estão desconectadas das práticas pedagógicas e administrativas locais.  Mudam-se as políticas e leis quando nem mesmo as anteriores foram avaliadas e sequer assimiladas às práticas educacionais. Alguns fragmentos de política e legislação educacionais são identificados, apenas formalmente, mas continuam estranhas aos hábitos culturais dos ambientes profissional e escolar. Algumas políticas jamais são absorvidas pelas práticas, são apenas justapostas a elas.

Em termos organizacionais, as Secretarias de Educação de grande parte dos municípios, mesmo daqueles há pouco tempo criados, segue a estrutura hierárquica das tradicionais secretarias de educação, nem sempre adequadas à realidade municipal.  Este fator impossibilita o desenvolvimento de um trabalho voltado para as necessidades locais em razão da ineficiência da máquina burocrática, de métodos e procedimentos administrativos.  Assim como o Estado reproduz as políticas nacionais, o município reproduz as políticas estaduais, reproduzindo, também, uma prática docente ineficiente e os resultadosnegativos decorrentes.

Esse processo inviabiliza o surgimento de um planejamento do trabalho pedagógico a partir da reflexão sobre a realidade local, transformando, talvez, bons profissionais em meros executores de políticas que impõem uma padronização do processo educativo escolar. Estas políticas verticais, reproduzidas nas políticas municipais são, claramente, observadas nas leis orgânicas dos municípios que embora deva fundamentar-se em diretrizes nacionais,poderiam ser espaços de geração de novas ideias. No entanto, não passam de meras adaptações ou cópias de aspectos da legislação nacional, inclusive, abordando preocupações alheias às necessidades desses municípios.

As Secretarias Municipais de Educação não executam um plano de trabalho sistemático de acompanhamento das escolas. Considera-se visita, muitas vezes, a passagem pela escola para a distribuição de produtos da merenda escolar quando o coordenador ou supervisor pedagógico conversa rapidamente com o professor. Não há, nem mesmo, qualquer instrumento de registro da informações colhidas na escola ou um trabalho sobre tais informações em função da melhoria do professor e do processo de ensino e  aprendizagem, como bem expressam os depoimentos de professores que se seguem.

         "Eu fico muito agradecida por você ter feito essa...como é que se diz...esse passeio aqui nessa escola porque a gente nunca recebeu a visita...assim...de outra pessoa, nem mesmo da própria secretária, nem a supervisora, a coordenadora ...às vezes eles vêm aqui na época que vem deixar material, uma merenda...só chegam atrasados...nunca chegam à escola pra saber...conhecer a realidade de cada aluno..".(Profa. Suzana, Demerval Lobão).

         "Pra melhorar a escola rural...tá faltando muita coisa. A primeira coisa que tinha de acontecer era cada sala fosse uma série...acabasse a multisseriada e outra coisa é que eles (os dirigentes) prestassem mais atenção. Aparecesse de vez em quando alguém mais influenciado...não deixasse  a gente jogado, tomando conta de tudo sozinha. Alguém da secretaria aparecesse, fizesse uma palestra com a gente, conversasse com os alunos da gente...tá faltando muito. Muitos cuidados que eles num têm...nunca tiveram". (Profa. Rosário,José de Freitas).

As estruturas físicas das escolas não dispõem dos espaços necessários ao desenvolvimento das atividades educativas. Em grande parte delas não há sanitário ou locais adequados para a recreação dos alunos. Todas as atividades são realizadas na sala de aula e os materiais didático-pedagógicos são guardados em armário na classe, na casa da professora ou de familiares que moram próximo da escola. Um professor assim se expressa:

                    "Tem lugar por aí que são bem organizado, mas ainda existe aqueles lugar que são difícil. Minha escola é um galpãozinho perto de casa. Ela num tá muito boa. Tá precisando fazer. Eles [dirigentes] dizem assim: a escola pode continuar aqui com os pais e a comunidade se reunindo e fazendo a casinha..." (prof. Justino Almeida, Canto Grande, Altos).

 As carteiras são sempre dispostas em fila ao longo da sala, de frente para o quadro de giz. É comum nas escolas a existência de dois quadros de giz. Este é um recurso importante porque, sendo a grande maioria das classes multisseriadas, permite o professor atender ao mesmo tempo mais de uma série, principalmente, para os exercícios e as avaliações que são copiadas no quadro.
A nova Política Nacional de Educação, através do Fundo de Desenvolvimento e Manutenção do Ensino Fundamental e valorização do magistério – FUNDEF1 provocou a substituição de parte de professores leigos por professores com o Curso Pedagógico.

 Os professores leigos com estabilidade foram aproveitados no pré–escolar, na 1asérie, na alfabetização, como auxiliar de classe ou nas funções de merendeira ou zeladora. O concurso público, de um lado, atraiu professores habilitados, mesmo para trabalharem na zona rural, em função da mudança da realidade salarial, não obstante ainda não ter evoluído o desejado e, de outro, gerou pressão das famílias sobre as autoridades para terem professores formados no Curso Pedagógico.

As escolas atendem somente de 1aà 4a séries do ensino fundamental, na grande maioria, multisseriadas. O horário de funcionamento segue a norma oficial de 7:30 às 13:30 e de  13:30 às 17:30 o que não significa que este tempo seja utilizado totalmente com atividades pedagógicas. A tarefa do professor leigo não se restringe às atividades pedagógicas. Eles acumulam funções administrativas, administrativo-burocráticas, pedagógicas e comunitárias. Atribuições de direção, coordenação, supervisão, transporte e armazenamento de materiais e merenda escolar, zeladoria, merendeira, correspondência escolar, resolução de problemas na secretaria municipal de educação, reuniões com os pais, planejamento, ensino, além de eventos, campanhas sociais, efemérides e trabalhos domésticossão algumas das atividades exercidas por ele.

As escolas nem sempre têm de equipamentos necessários mesmo o mínimo para o seu funcionamento e, no entanto, há outros equipamentos como TV e vídeo que não são utilizados para a melhoria do processo de ensino e aprendizagem.   Tais equipamentos são oriundos de programas nacionais, aceitos pelo estado ou município para poderem receberos recursos, mas após colocá-los em sala de aula há dificuldades de assistência técnica. Ao darem qualquer defeito, permanecem na escola sem nenhuma utilidade pedagógica. As salas de aula têm sempre as paredes cobertas de cartazes, sobre conteúdosa serem ensinados, figuras, desenhos, mapas, etc embora dificilmente os professores os utilizem como material de apoio. São, geralmente, trabalhos feitos pelos professores em treinamentos ou para dar aulas e feitospelos alunos sobre temas de efemérides.

O processo de apropriação de saberes sociais e do cotidiano escolar contribui para a construção de uma competência intelectual e linguística instrumentalizadora  da luta pela inserção social e profissional. Os saberes destas relações do cotidiano escolar criam códigos que estruturamblocos de resistência ao controle exercido pelas normas oficiais que organizam a escola e a impõem saberes e significados determinados para serem disseminados na escola. As práticas pedagógicas construídas por professores leigos estabelecem fronteiras entre áreas de saberes oficiais e do cotidiano escolar, responsáveis, ao mesmo tempo, pela preservação da imagem do professor e de um espaço de saberes pedagógicos pelos quais a escola rural cumpre o seu papel de socializadora da cultura local e universal.

Ao contrário do que, geralmente indicam várias pesquisas sobre a prática pedagógica do professor leigo consideradas reprodutoras e ingênuas, o seu trabalho de sala de aula revela uma multiplicidade de saberes apropriados e reelaborados pela experiência das múltiplas funções a que ele é solicitado a exercer na escola e na comunidade. Por isso, em nível local, ele é de certo modo, valorizado. Com a implantação de Secretarias Municipais de Educação, as ações de controle sobre a escola rural restringiu a função socializadora que a escola urbana, preocupada em responder demandas de mercado, já perdeu há muito tempo; e quando há alguns resquícios disto, são chamadas de atividades extra-classe ou dentro de uma nova terminologia dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs de "temas transversais", que embora tenham uma amplitude maior inclui possíveis espaços sociais e culturais.

Aescola rural ainda conserva esta herança socializadora de que fala Arroyo, (1996), como tarefa curricular através de "conhecimentos, representações, valores, modos de conduta, de vida, hábitos, rituais, símbolos, artefatos e técnicas" (p. 170).  A escola rural ainda é esse espaço de cumplicidade de construção e celebração da história local onde pensar, sentir e agir se aglutinam contraditoriamente em explosões de comemorações da vida cotidiana. Assim, deve-se questionar a ideologia de capacitação docente tão enfatizada nos últimos anos quanto a uma identidade cultural do professor e quanto a seus reflexos na ação docente que possa estar levando a uma assepsia do cotidiano escolar em detrimento de uma escola de vivência e convivência da cultura a partir das tradições locais.

É intrigante refletir sobre como a organização oficial da escola determina, a priori, um tempo para que todos os aluno aprendam determinados conteúdos curriculares, independente de sua herança cultural, biológica e das condições de vida deles. Se não aprende, vai logo incluído no rol dos que apresentam dificuldades de aprendizagem e encaminhado para as chamadas classes especiais.  Isto camufla interesses de exclusão social ou de manutenção desta exclusão escolar e social que implicam, por sua vez, nas questões da igualdade e da cidadania. Tais mecanismos, subliminarmente, tentam fazer os indivíduos acreditarem, como natural, que alguns nascem mais capazes e outros menos e, em decorrência disto, a aceitarem também como natural as futuras posições que eles possam ocupar na sociedade.

Desse modo, a chamada cultura escolar cristaliza no espaço social das práticas pedagógicas um conjunto de múltiplas interações e representações que deságuam em saberes, habilidades e valores, gerando estereótipos sociais que pintam um retrato sem rosto da escola cotidiana viva de relações de troca e de conflitos, em que os sujeitos protagonistas de uma história real, concreta, desaparecem nessas estruturas anônimas da instituição.

Para Arroyo, "a escola não deixa de ser centro de comemoração, de celebração coletiva da memória coletiva, dos saberes, valores, rituais, crenças e dos modos de conduta, se ela não fizer isso perde sua função histórica" (p. 170). A escola concreta, em construção histórica, racionalmente subjetiva, luta contra a escola anacrônica, pré-concebida, mas com força legal para sufocar a escola nascente do cotidiano em busca de liberdade.

5.2.1 - Recreio: Resgatando a infância

O tempo e o espaço do recreio na escola rural têm um sentido particular na vidas de suas crianças. Sente-senos seus semblantes um clima de ansiedade e expectativa por este momento. É comum a preocupação dos alunos, interrompendo a professora e esta usando isso para fazê-los cumprir as tarefas, em delimitar os espaços de sua autoridade e manter a sua representação de alunos, assimilada da cultura escolar, através da atenção e disciplina. Um aluno indaga a mestra: "Professora, vai ter recreio"? Outro aluno: "Professora, que hora vai ser o recreio"? O que ela responde: "Se vocês não fizerem o exercício e não prestarem atenção, vamos ficar aqui...esses que estão conversando vão ficar aqui na hora do recreio...quem não terminar o exercício vai ficar terminando na hora do recreio".

Enquanto os alunos fazem tarefas, a professora vai à cozinha e verifica se a merenda já está pronta, isso em escolas onde há merendeira porque quando não, ela concilia o tempo de exercício com ao preparo da merenda ou da alimentação de sua família, em sua casa,quando mora perto da escola.  Nisto, há uma representação tácita de gênero na divisão de tarefas escolares onde somente nas escolas com professoras ocorre esta cumulação, de papéis docente, administrativo e doméstico, consideradas como naturais uma vez que a escola é apenas mais uma tarefa de mulher naquele contexto. Quando setrata de um professor, há na escola a figura da merendeira, sempre uma mulher; o mesmo ocorre para a função de zeladora. Isso quer dizer que as representações sobre a divisão social do trabalho local tem forte influência na divisão do trabalho no interior da escola.

Ainda sobre o recreio, o que se observa é que mal o professor insinua que está na hora do recreio, os alunosfecham rapidamente os cadernos e livros em meio ao eco de vozes de conversas e saem desordenadamente em direção ao local de distribuição da merenda, que só é distribuída quando o professor chega para ordenar o seu início, após a organização da fila, do menor para o maior, meninos de um lado e meninas de outro.   

Tais rituais, repetidos anos a fio, representam o confronto do quotidiano com as normas institucionais, transmissoras de hábitos e valores que devemmodular a conduta de alunos "rebeldes" para torná-los "educados". Neste aspecto, professores e dirigentes escolares parecem teruma representação da escola tanto comolugar para se aprender os conteúdos disciplinares, como também para aprender a "ser gente", que na linguagem local significa serem obedientes, compreensivos e respeitosos para com os mais velhos e os superiores. Embora a escola seja o lugar privilegiado de transmissão desses saberes, tais representações estão amalgamadas nas relações sociais da tradição dacultura local.

Em primeiro lugar,o recreio representa a satisfação de uma necessidade biológica porque é a hora da merenda que para a maioria, emcertas épocas do ano,  como na entre safra e nos períodos de estiagem, torna-se a principal alimentação do dia; em segundo lugar, é um dos poucos momentos que estes alunos podem viver a sua idade, ser criança, sonhar através das representações que vivem e constroem nas brincadeiras que no seu cotidiano familiar são substituídas por tarefas domésticas e pelo trabalho no campo; é, também uma necessidade psicológica de romper o isolamento e encontrar os colegas, conversar, brincar ou estabelecer conflitos, naturais, no jogo de definição de espaço e posição nas relações sociais que se manifestam, inicialmente, na escola ou de aflorar, através deles, os vínculos de amizade ou animosidade que se dão entre suas famílias e parentes no espaço social local.

O horário de recreio, nas várias escolas pesquisadas, varia entre 20 a 50 minutos, dependendo de haver ou não merenda escolar ou da ocupação doméstica da professora quando reside próximo da escola. A merenda escolar quando há, compõe-se basicamente de leite em pó, suco, biscoito, macarrão e sardinha.  Em algumas escolas quando não há merenda escolar não há recreio A intervenção do professor nas atividades de recreio só se dá, geralmente, para interromper, chamar atenção e, a não ser que haja conflito, meninos e meninas se agrupam por critérios culturais do costume: parentesco, amizade e sexo, independente de idade onde as relações de coeducação também ocorrem por processos informais. As meninas se agrupam para conversar e os meninos para correr e jogar bola.

A escola, mais que necessidade material, social ou cultural, parece ser uma necessidade psicológica para as crianças, adolescentes e jovens. A ausência de lazer e diálogo em casa onde há, geralmente, tarefas determinadas, as crianças aparentam ansiosas para chegar a hora de ir à escola. Lá encontram outras crianças, amigos e poderão conversar e brincar. A escola parece ser concebida como lugar e momento de lazer onde a principal preocupação não é aprender, mas participar de um momento social para compensar a dura rotina de vida de trabalho do campo. A aparente indisciplina parece ser uma expressão da necessidade psicológica de brincar e relacionar-se comos outros.

O tempo de recreio se alonga conforme as atividades extraclasse, administrativa e doméstica que o professor assume.  A organização do tempo do recreio, prescrita em regimentos escolares, não segue regra oficial, sendo determinado não pelo relógio, mas por um processo natural, biológico. Os turnos escolares (manhã e tarde) se definem pelo costume local e pela dinâmica das tarefas. Enquanto o professor urbano tem mais dificuldade de modificar a organização do tempo oficial, elemento essencial para o controle burocrático da escola, o professor leigo, em grande parte, é quem o controla. Isto decorre do fato de que as várias funções burocráticas da escola, de execução e de controle são assumidas pelo próprio professor. Estas características parecem revelar o baixo grau de profissionalização da função docente na escola rural.

Perfil dos Alunos

Os alunos são filhos de agricultores da região, quase sempre moradores ou trabalhadores das fazendas, diaristas ou meeiros. Nesse caso, o trabalho é pago pela partia da produção, geralmente na proporção de uma parte para o trabalhador e quatro partes para o patrão. Observou-se que a frequência do aluno tem relação direta com a merenda escolar. Muitas dessas criançaschegam à escola sem tomar café ou no período da tarde sem terem sido alimentadas suficientemente. É comum nas crianças a subnutrição e verminose. Isso se comprova não só pelas precárias condições de vida de suas famílias, como pela apatia,dificuldade de concentração e deaprendizagem (distorção idade/série) e, ainda, pela defasagem na relação idade/altura. Uma das professoras diz o seguinte a esse respeito:

         "A maior dificuldade que eu sinto aqui, tanto na 2a série, 3a e 4a , são os alunos. Eles são muito fracos... são doentios... faltam muito. Tem criança aqui que passa cinco dias sem pisar na escola. Esse é o maior problema que eu sinto...deles serem fracos...famintos...eu acho que não estou preparada..." (Profa. Rosário, José de Freitas).

A frequência de alunos e professores é sempre interrompida pelas atividades agrícolas, religiosas e folclóricas tradicionais do lugar: plantio, colheita, farinhada, novenas, festas familiares, doenças pessoais, familiares, planejamento e dia de pagamento do salário. Observou-se que as residências dos alunos têm as paredes enfeitadas com retratos de políticos, artistas, figuras de santos, de religiosos mitificados, como o papa, o padre Cícero, frei Damião, calendários, folhas de revistas de fotonovelas, etc. Infere-se que este costume representa uma tradição local que está muito mais ligada ao processo de isolamento cultural dessa população e a uma concepção de residência, reproduzindo as antigas moradias dos patrões. O mesmo sistema se reproduz nas salas de aula, acredita-se por isto que os enfeites não indicam uma preocupação pedagógica, mas assumem um conjunto de significados ligados àstradições familiares para a atividade profissional de ensino e, por outro lado, como uma representação da atuação do professor e da qualidade da escola. Isso deixa boa impressão a visitantes e a coordenadores pedagógicos. A infinidade de cartazes que o professor poderia utilizar como apoio ao processo de aprendizagem dos alunos e através deles explorar conteúdos informativos e de ensino estão totalmente desvinculados da prática pedagógica cotidiana.

A relação de parentesco entre alunos e professores substitui a relação profissional pela familiar onde o tratamento de respeito (senhor, senhora, dona) dá lugar a tia, madrinha. Isso revela o traço familiar da cultura escolar e comunitária, constituindo-se num dos fatores de resistência aos processos administrativos impessoais e em uma herança da cultura de submissão, na qual fazer parte da relação de parentesco ou amizade de lideranças ou autoridades, transfere a elas status e respeito dos demais e quanto maior o grau de relação, maior o acesso aos benefícios  dos espaços sócio–administrativos. Deste modo, os espaços domésticos e escolares se fundem. É comum os alunos levaremà escola não só os irmãos menores, mas até animais de estimação. Isso tem várias implicações de ordem prática e pedagógica, dentre elas, a função dos irmãos mais velhos de cuidarem dos mais novos, permitir à mãe se ocupar dos afazeres domésticos, auxiliar na alimentação dos filhos que merendam na escola. Para o trabalho docente, esta situação cria uma espécie de pré-escolar informal. O professor prepara atividades para estas crianças menores mais para mantê-las ocupadas que para desenvolver nelas alguma habilidade de preparação para a leitura e escrita, embora isso acabe ocorrendo.     

Ainda não temos uma educação do campo e muito menos uma educação de qualidade. A escola, neste contexto de desigualdade e pobreza é a única ideia que destoa da vida rural cuja população ainda luta pela sobrevivência. A escola rural serve menos a formação de uma cidadania capaz de transformar vidas e mais a uma rede de atores lutando para manutenção de poder político. E conômico e social. Neste aspecto, a escola é, apenas, uma miragem de esperança de conquista de Direitos civis, políticos e sociais, considerando-se que o que esta população aprende na escola jamais lhe dará condições em pé de igualdade para participar da competição social.



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1 FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério foi instituído pela Emenda Constitucional No 14, de setembro de 1996 e regulamentada pela Lei 9.424 de dezembro/96, juntamente com o Decreto 2.264 de junho/97. O Programa foi implantado, nacionalmente, em 1o de janeiro de 1998. Sua maior inovação consiste na mudança da estrutura de financiamento do Ensino Fundamental (1a à 8a séries, antigo 1o grau. O Fundo compões, basicamente,de recursos dos próprios estados e Municípios, acrescidos da parcela da União, sendo 15%do FPE- Fundo de Participação dos Estados, do FPM - Fundo de Participação dos Municípios, do ICMS - Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços e do IPIexp - Imposto sobre produtos industrializados proporcional às exportações. Os recurso do FUNDEF são distribuídos para capacitação do magistério (40%), conforme Art. 70 da Lei 9394/96 (LDB) e para remuneração do magistério (60%), conforme Resolução 03 de 08.10.97 do Conselho Nacional de Educação. As implicações do FUNDEF no Ensino Fundamental se concretiza através  da participação da comunidade nos Conselhos de Acompanhamento da execução do Programa; da profissionalização da carreira docente, através dos planos de carreira, capacitação, melhores salários e melhores condições materiais e de trabalho (aspectos físicos dos prédios, equipamentos, acervo bibliográfico, geração de empregos em função das operações de construção e compra de materiais, manutenção de transporte escolar e, em consequência de tudo isso, a universalização do acesso à escola e melhoria da qualidade do educação escolar.

terça-feira, 17 de novembro de 2015

SABERES DA EXPERIÊNCIA DOCENTE : DO IMPREVISTO AO IMPROVISO
EXPERIENCE THE KNOWLEDGE TEACHER : DO TO CONSEQUENTIAL IMPROVISO


José Ribamar Tôrres Rodrigues
Doutor em Educação pela USP
Mestre em Educação pela PUC/SP
Estágio em Formação de Professores no IUFM de DOUAI/ França
Estágio em formação de Professores em CUBA
Ex-Membro do Conselho Estadual de Educação/PI
Coordenador do Fórum Estadual de Educação
Membro do Banco de Avaliadores do MEC/INEP.

José Ribamar Rodrigues Tôrres
PhD in Education from USP
Master in Education from PUC / SP
Internship in Teacher Training in the IUFM of DOUAI / France
Stage for Teacher training in Cuba
Former member of the State Board of Education / PI
Coordinator of the State Education Forum
Member of Appraisers Bank MEC / INEP.



Este trabalho analisa como o processo de construção dos saberes pedagógicos é determinado pelos saberes oficiais, legais, pelo contexto organizacional e pelo contexto da prática docente. Neste aspecto, surgem os conflitos gerados pela falta de domínio científico dos conhecimentos a serem ensinados, valendo-se o professor dos saberes de sua experiência para manter sua imagem de autoridade pedagógica frente aos alunos e comunidade escolar. Analisa os eventos da prática docente que acontecem na sala de aula com base nas categorias teóricas do HABITUS de Pierre Bourdieu e as visões empirista e fenomenológica segundo Maurice Tardif(1996) sobre saberes da experiência.  Aplicam-se estas categorias para a compreensão das relações de aprendizagem em sala de aula, criando-se o termo Habitus Pedagógico para expressar o resultado do processo de construção de saberes na prática docente.



This paper analyzes how the process of construction of pedagogical knowledge is determined by the official , legal knowledge, the organizational context and the context of teaching. In this respect , there are conflicts generated by the lack of scientific field of knowledge to be taught , drawing on the teacher of your experience of knowledge to maintain its image of teaching authority ahead to the students and school community. Analyzes of teaching practice events that happen in the classroom based on theoretical categories of Pierre Bourdieu HABITUS and empiricist and phenomenological second Maurice Tardif (1996 ) about the experience knowledge. Apply these categories to the understanding of learning relationships in the classroom , creating the Pedagogical Habitus term to express the result of the knowledge building process in teaching practice .


 Ce document analyse la façon dont le processus de construction de connaissances pédagogiques est déterminée par la connaissance juridique officiel , le contexte organisationnel et le contexte de l'enseignement . À cet égard , il ya des conflits générés par l'absence de champ scientifique des savoirs à enseigner , dessin sur l'enseignant de votre expérience de la connaissance pour maintenir son image d'autorité enseigner à l'avance pour les élèves et la communauté scolaire . Analyse de l'enseignement de la pratique des événements qui se produisent dans la salle de classe en fonction des catégories théoriques de Pierre Bourdieu habitus et empiriste et phénoménologique selon Maurice Tardif (1996 ) à propos de la connaissance de l'expérience . Appliquer ces catégories à la compréhension des relations dans l' apprentissage en classe , en créant le terme pédagogique Habitus pour exprimer le résultat du processus de renforcement des connaissances dans la pratique de l'enseignement .

Este artículo analiza cómo el proceso de construcción del conocimiento pedagógico está determinada por el conocimiento oficial , legal, el contexto de la organización y el contexto de la enseñanza. En este sentido , hay conflictos generados por la falta de campo científico de los conocimientos que se les enseñe , dibujo en el profesor de su experiencia de conocimiento para mantener su imagen de la enseñanza de la autoridad por delante de los estudiantes y la comunidad escolar. Analiza las prácticas de la enseñanza acontecimientos que suceden en el aula basado en categorías teóricas de Pierre Bourdieu HABITUS y empirista y fenomenológica segundo Maurice Tardif (1996 ) sobre el conocimiento experiencia. Aplicar estas categorías a la comprensión de las relaciones en el aula de aprendizaje , creando el término Pedagógica Habitus para expresar el resultado del proceso de construcción del conocimiento en la práctica docente .

Questo documento analizza come il processo di costruzione della conoscenza pedagogica è determinato dalla conoscenza giuridica ufficiale , il contesto organizzativo e il contesto di insegnamento . In questo senso , ci sono conflitti generati dalla mancanza di campo scientifico di conoscenza da insegnare , attingendo l'insegnante della vostra esperienza di conoscenza per mantenere la sua immagine di insegnare l'autorità davanti agli studenti e comunità scolastica . Analizza di insegnare eventi pratiche che avvengono in classe sulla base di categorie teoriche di Pierre Bourdieu HABITUS e empirista e fenomenologica secondo Maurice Tardif ( 1996) circa la conoscenza dell'esperienza . Applicare queste categorie per la comprensione delle relazioni di apprendimento in aula , creando il termine Pedagogico Habitus per esprimere il risultato del processo di costruzione della conoscenza nella pratica didattica.
 
Dieses Papier analysiert , wie der Prozess der Konstruktion des pädagogischen Wissens wird durch die offiziellen , Rechtskenntnisse , die organisatorische Kontext und der Kontext der Lehre bestimmt. In dieser Hinsicht gibt es Konflikte durch den Mangel an wissenschaftlichen Wissensgebiet erzeugt wird, um gelehrt werden und dabei auf die Lehrer Ihrer Erfahrung des Wissens , sein Image der Lehre Behörde voraus, um die Schüler und Schulgemeinschaft zu erhalten. Analysen der Unterrichtspraxis Ereignisse, die im Klassenzimmer auf der Grundlage theoretischer Kategorien von Pierre Bourdieu HABITUS und Empiriker und phänomenologische zweiten Maurice Tardif (1996) über die Erfahrung Wissen geschehen . Übernehmen Sie diese Kategorien zum Verständnis von Lernen Beziehungen im Klassenzimmer , die Schaffung der Pädagogischen Habitus tigen , um das Ergebnis der Wissensbildungsprozessin der Unterrichtspraxis zum Ausdruck bringen.
 
Эта статья анализирует, как процесс строительства педагогического знания определяется по официальному , правовых знаний , в организационном контексте и контексте преподавания . В этом отношении , есть конфликты , порожденные отсутствием научно области знаний , чтобы учить , опираясь на учителя вашего опыта знаний для поддержания своего имиджа преподавания власть вперед для студентов и школьного сообщества . Анализирует практики преподавания события, которые происходят в классе на основе теоретических категорий Бурдье габитус Пьер и эмпирика и феноменологическим второй Морис Tardif (1996 ) об опыте знания. Применить эти категории к пониманию обучения отношения в классе , создавая термин педагогический габитус , чтобы выразить результат строительного процесса знаний в педагогической практике .
 
Sorry about the mistakes. It is virtual translation.

Os saberes pedagógicos são determinados, de um lado, pelo currículo oficial de formação docente como as disciplinas instrumentais (didática, metodologia, estrutura e Funcionamento da educação básica) e as disciplinas de fundamentos da educação (filosofia, psicologia, sociologia), por outro, além disso, concorrem para as condições  de construção destes saberes, os limites legais e organizacionais. O imprevisto diz respeito ao conjunto de atividades pedagógicas previstas para serem executadas na sala de aula pelo professor sem o preparo profissional suficiente para executá-las, gerando situações de variados graus de dificuldades para ele desconhecidas. Em razão disto, as práticas, baseadas na experiência, por ele utilizadas em sala de aula para enfrentar imediatamente tais dificuldades, caracterizam o improviso.

Os saberes da experiência, fundamentados na prática do professor leigo, são incorporados pela formação prática, através da incorporação do que nomeamos de habitus pedagógico, ao longo do exercício docente, tal como acontece com o artesão, o curandeiro, o pajé, ou o prático, tanto pelo processo da oralidade quanto pela repetição ou imitação, incorporadas das relações sociais  e das representações destas decorrentes. Análises deste tipo foram realizadas por Carlos Rodrigues Brandão, (1983) em seu livro Casa de Escola e Sônia de Vargas (1995) em sua tese de doutorado.

 Nesse sentido diz Pierre Bourdieu (1996)
A capacidade de reproduzir activamente os melhores produtos dos pensadores do passado, pondo a funcionar os instrumentos de produção que eles deixaram, é a condição do acesso a um pensamento realmente produtivo. (Pierre Bourdieu).

O professor leigo rural estrutura um tipo de universo mágico de saberes absorvidos, mediante o processo de ensino mútuo 2, pelo qual os mais velhos passam a experiência para os mais novos que desde cedo acompanham os adultos e executam tarefas. É comum observar os rituais religiosos na área rural (as chamadas rezas) onde os benditos (orações e ladainhas), são rezadas ou cantadas, ainda hoje, misturadas com palavras do latim. Mesmo sem saber o significado denotativo, repetem o que aprenderam na tradição passada pelos mais velhos. Embora rezados com partes em latim, eles parecem entender o que estão dizendo, senão um significado individual, pelo menos um significado do imaginário coletivo.

Do mesmo modo, no trabalho de sala de aula, o professor passa para os alunos esse saber mágico tal qual o artesão ou o curandeiro, o faz por meio do ensino mútuo que, possivelmente, garantirá a continuidade da tarefa de renovação deste saber necessário à identidade desta gente como comunidade. Os saberes ministrados pelos professores leigos assumem o caráter mágico quando cabe ao aluno incorporá-los sem maiores questionamentos. A prática de sala de aula do professor leigo repete este mundo mágico da tradição oral local.

Tardif (1996) ao falar a respeito de saberes da experiência coloca duas visões: a empirista e a visão fenomenológica. A visão empirista ou instrumental da experiência cotidiana apresenta-se em dois níveis. No primeiro, através do processo ensaio-erro, no qual o professor interfere na medida em que os fatos se repetem. Nesse sentido, constitui-se num “processo de aprendizagem espontânea que possibilita a aquisição de certezas quanto à maneira de controlar os fatos e situações que se repetem”(p.63).

No segundo nível, da experiência científica, supera o processo espontâneo para o “processo consciente, sistemático, voluntário e metódico3. A concepção empirista supõe que o ensino e a pedagogia podem ser objeto de várias ciências, elaboradas por pesquisadores de educação e os resultados podem ser utilizados pelo professor para a solução de problemas concretos e atingir objetivos educacionais. O professor se apoia nas teorias e procedimentos científicos das ciências. A visão fenomenológica ou interativa argumenta que é um processo de aprendizagem e compõe-se de vários saberes: pragmáticos, tradicionais ou tácitos. O professor toma por base de ação o costume, os modelos práticos, legitimados pelos resultados e cria um estilo próprio de fazer. Para ele, a experiência não consiste de repetição de situações e controle progressivo dos fatos, mas da intensidade e do significado de uma situação vivida por um indivíduo.

Os saberes da experiência docente, dentre outros saberes, incorporam os saberes pedagógicos oriundos das ciências da educação e os saberes pedagógicos oriundos da prática cotidiana. Os saberes oriundos das ciências da educação são incorporados pelos professores leigos, por meio dos livros didáticos, dos treinamentos a exemplo  da  semana  pedagógica  realizada a cada  início de período letivo quando as equipes técnicas informam aos professores asnovidades da atividade docente, quando treinam novas técnicas e elaboram atividades e materiais a serem utilizadas em sala de aula. Exemplo disso são os constantes treinamentos sobre a teoria construtivista nos quais o professor assimila somente a dimensão instrumental e ignora os fundamentos científicos da proposta. Isso caracteriza a função apenas executora do professor leigo e não de criação e de reflexão.

Dentre as várias tarefas atribuídas ao professor leigo estão os afazeres domésticos nos quais se sobressai o de cuidar dos filhos. Muitos professores, para conciliar o trabalho de sala de aula com as obrigações familiares, levam os filhos menores para a escola onde, geralmente, eles brincam de estudar, olhando as figuras de livros, fazendo garatujas em folhas de papel, colorindo desenhos ou participando de tarefas com os alunos iniciantes. Estas práticas constituem um marco nos primeiros contatos de crianças com o processo de apropriação de um amplo repertório que aos poucos acabam por formar um determinado tipo de habitus pedagógico docente. Na realidade, a maioria dos futuros professores tem, antes, na convivência familiar, o marco zero na sua iniciação ao gosto pelo trabalho docente quando a mãe, irmãos, tios ou outros parentes exercem o magistério.

O Livro Didático: O Escudo da Competência Docente

O livro didático seria um mecanismo para romper com essa magia, estabelecendo saberes concorrentes aos saberes mágicos da cultura local, mas muitos professores o utiliza para reforçar esta prática ingênua. A organização do ensino, feita pelo professor leigo em sala de aula, é limitada tanto por normas institucionais quanto pelo pouco preparo do professor e pelas condições de trabalho.

Há alguns anos atrás, quando o programa do livro didático do Ministério da Educação não tinha a amplitude e a regularidade que tem hoje, alguns livros didáticos chegavam às escolas rurais do Piauí via Secretaria de Educação dos estados, municípios ou através do professor que utilizava livros e cartilhas do seu tempo de estudante ou adquirido junto a colegas, a familiares seus ou de alunos. Geralmente, adotavam para a alfabetização a Carta do ABC e, para as primeiras séries do ensino fundamental, um livro muito popular que passou por várias gerações intitulado O Nordeste.

 Além disso, o professor completava sua "biblioteca" com uma coleção de cadernos da sua trajetória estudantil.  Anteriormente, conforme pesquisa do curso de mestrado deste autor realizada nas escolas rurais do Piauí, o currículo escolar da prática docente era caracterizado, principalmente, pela execução de atividades extraídas da memória estudantil, dos seus antigos cadernos  ou do cotidiano da cultura local, dentre outras, canto, reza, danças folclóricas, desenho, pintura, que ocupavam a maior parte do tempo de aula. A prática curricular do professor leigo segue uma espécie de "currículo memorial". Com a intensificação dos programas de treinamentos regulares, parcelados ou em serviço, implantado pelo Ministério da Educação em convênio com os estados e municípios e o Programa do Material Didático, implantação de órgãos municipais de educação, iniciou-se a atividade de planificação da educação, subsidiado por sucessivas pesquisas, resultantes de acordos internacionais, a exemplo dos programas Pró-Município, Polonordeste, Edurural e, hoje, o Projeto Nordeste (ver nota 2, capítulo  I).
A partir deste processo de organização da escola municipal, observou-se mudanças significativas na prática do professor leigo, considerando-se as décadas de setenta, oitenta e noventa. Os professores leigos mais novos incorporaram novos habitus intelectuais, teóricos e metodológicos.  As resistências às mudanças foram vencidas, em parte, pelo processo de renovação da massa de professores leigos, em razão de aposentadorias, abandono do magistério espontâneo ou por demissão pela prática político-partidária da época, por ocasião da mudança de administração, porém hoje, praticamente abolida, pelo processo de admissão mediante concurso público, introduzido pela política educacional, do FUNDEF.

A antiga prática curricular do professor leigo, que ocupava a maior parte da aula com atividades recreativas, religiosas, folclóricas ou artísticas, aos poucos foi dando lugar ao planejamento curricular com atividades e conteúdos apoiados pelo livro didático e, mais recentemente, pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Na escola rural do Piauí, os planejamentos mensais de ensino transformaram-se em micro-treinamentos em que os professores aprendem os conteúdos e atividades que deverão realizar na sala de aula. Além disso, o sistema de controle, através de visitas às escolas, reuniões com os pais, verificação dos cadernos dos alunos, da caderneta do professor, a solicitação de relatos aos professor sobre sua prática de sala de aula e, até, aplicação mensal de provas aos professores sobre os conteúdos das séries que ele ensina; bem como sorteio de professores durante os planejamentos mensais para ministrarem micro-aulas aos colegas sobre assuntos do currículo, definidos no planejamento anterior tudo isto não só obriga o professor a estudar como tem a função de aperfeiçoamento na troca com os colegas.

Apesar destas mudanças, observou-se com espanto que mesmo com a massificação de treinamentos e cursos, controle e avaliação do professor leigo, este não abandonou o que se designava "currículo memorial", isto é, conteúdos, métodos e atividades da época de estudante, dos seus cadernos escolares de onde ele extrai parte de exercícios e avaliações que aplica aos seus alunos.

É provável que a linguagem utilizada pelo livro didático dificulte a compreensão tanto de professores quanto de alunos, fazendo o professor recorrer, em seus antigos cadernos, a formas de redação cujo vocabulário é compatível com a cultura local, facilitando as respostas dos alunos, conhecidas pelo professor e para as quais já detém uma explicação aceita como correta.  Embora o gabarito dos exercícios do livro didático venha no livro do professor os docentes demonstram mais segurança naquelas respostas por ele incorporadas na trajetória estudantil.

O que se pode concluir, talvez, é que o livro didático embora seja de grande valia para o trabalho pedagógico do professor leigo e apresente os conteúdos mínimos necessários para introduzir o aluno no mundo letrado, não está vinculado a uma identidade cultural (histórica, sociológica e política) desta população, justapondo-se a ela pela imposição da cultura oficial. Isso não significa que seja uma deficiência do livro didático, construído para garantir uma "homogeneidade" cultural da escola nacional. Este parece o aspecto nevrálgico da prática docente, especialmente do professor leigo, no trabalho de mediação do processo de ensino e aprendizagem escolar: "traduzir" os conteúdos acumulados historicamente, articulandos-os dialeticamente com os conteúdos da cultura da realidade local para ensejar a compreensão de sua própria cultura como forma de apropriação da realidade mais ampla e vice-versa.

A prática do professor leigo, em geral, ignora a compreensão da realidade dos alunos do meio onde vivem e trabalham e exige a compreensão de uma realidade de conteúdos abstratos, baseados na acumulação de informações através do processo de memorização. De modo geral, as atividades propostas nos livros reforçam uma prática pedagógica acrítica de alunos  e professores.  Do aluno, não só porque trazem situações desconhecidas para eles, sem qualquer relação com sua realidade e sem orientação que lhe permita comparar, diferenciar, construir significados em contextos diferentes, mas também, porque o aluno é obrigado apenas a decorar.  Do professor, porque sem conhecimentos mínimos suficientes e sem orientação para explorar os assuntos, se vê obrigado a seguir o livro e a repeti-lo.  A exemplo disso, em uma sala de aula observada, o livro de estudos sociais de 3a série trazia um texto sobre a geada. A geada queimou a lavoura.   Acontece que as crianças nunca viram uma geada, segundo eles, nem mesmo na TV que nessa região só se vê por meio de parabólica, mas eles não a têm por falta de energia elétrica. Eles não tinham nenhuma noção do que fosse.

Não se defende adaptação curricular, mas a compreensão comparativa entre conteúdos gerados em diferentes realidades e articulados com diferentes áreas de saber. Considera-se que o cotidiano e o científico ao mesmo tempo que se opõem, também se completam. O importante é não ignorar os significados sociais da palavra porque aí estar-se-ia condenando o processo de produção de novos conhecimentos, mas que o professor tivesse condição de encaminhar os alunos para a construção de novos conceitos a partir do tema geada, articulando os vários temas do currículo. Por exemplo, mudanças de estado da matéria, o continente gelado (Antártida), uso do gelo, as mudanças do comportamento humano provocados pelo gelo, influências econômicas (na produção de alimentos, vestuário, nos costumes) e, assim, alargar os horizontes conceituais dos alunos.

O livro didático torna o professor leigo um mero executor de modelos, independente da realidade onde estejam. O livro que poderia ser um instrumento para fundamentar sua prática e, no confronto com o cotidiano, constituir-se em uma nova fonte de produção de saberes, produz uma prática tão acrítica quanto a espontânea. Um dos professores que participou da pesquisa disse:

                     "Esse ano eu tô sentindo dificuldade enorme pra trabalhar. Já fui à secretaria varias vezes. Não tô me sentindo bem porque o sistema foi mudado. Nós vamos trabalhar com o construtivismo e como eu já falei, é uma questão de aula prática e nós não temos material. A gente passou um treinamento de cinco dias, mas eu achei insuficiente, devido a prática que a gente já tinha no outro sistema" (Prof. Marcos, Lagoa do Piauí).

O livro didático melhorou a condição material do ensino, mas o pouco preparo do professor leigo para utilizá-lo, transformou-o em um modelo único a seguir, engessando a prática docente, fazendo predominar a transmissão de conteúdos isolados da realidade dos alunos.

Voltando ao texto da geada,  enquanto o professor tomava a letras dos alunos, a região passava por um grave  período de seca com temperaturas acima de 40o graus e aos fundos do terreno da escola, na casa de farinha, acontecia a farinhada. Esta rica atividade da cultura local, ignorada pela escola, era excluída da atividade pedagógica baseada unicamente no livro.

Em outra sala de aula observada o professor tomava a letra de um texto sob o título O Grilo,tratando sobre o animal e dando conotações diferentes à palavra. A atividade realizada consistia, apenas, em leitura pelos alunos. Apesar de ser um animal muito comum na região, não há qualquer articulação com a realidade dos alunos.  O professor não amplia as informações sobre o tema através de tarefas de observação deste inseto ou debate para levantar o conhecimento que o aluno já tem ou da  integração do assunto a outras matérias como forma de ampliar a aprendizagem dos alunos. Enquanto a professora faz perguntas do texto contidas no livro, estes conversam sobre o que está acontecendo ao redor da escola: a colheita do arroz.

O professor segue o livro ignorando o que acontece na vida destes alunos. A colheita do arroz poderia ajudar o trabalho do professor na articulação de conteúdos de várias matérias com a realidade dos alunos, favorecer a aprendizagem deles e a compreensão do seu meio e da sua cultura. Por exemplo, como as pessoas se organizam para a colheita, como colhem, transportam e armazenam, valor nutritivo do produto, utilização da casca, tipos de alimento, tarefa de cada membro da família na colheita, quantidade produzida, área plantada, preparação do solo, tipos de ferramentas utilizadas na colheita, no plantio e na preparação do solo, utilidade do vegetal após a colheita, sistema de medida local, como transformar para  a medida oficial : o quilograma ou quilo.

Dos doze professores participantes desta pesquisa, apenas na prática de três deles observaram-se momentos pontuais em que tentam articular os conteúdos estudados com a realidade onde vivem.

                     "Eu, por exemplo, faço uma introdução daqueles conteúdos que eu quero trabalhar...trabalho questões e depois sempre o livro didático.  Não uso só o livro didático como recurso, uso também meus conhecimentos e os conhecimentos do próprio aluno. A gente pega o conhecimento deles, renova onde é  necessário e finalmente a gente vai para o livro didático" (prof. Marcos, Lagoa do Piauí).

A propósito disso, transcrevemos, a seguir um trecho da aula desse professor que tenta articular ciências, português e geografia, dentre outros conteúdos que o tema sugere.

"Prof. - Vamos começar a fazer uma redação sobre o meio ambiente . Vocês vão ver na página 79 do livro de ciências...lá tem um texto sobre o meio ambiente.  Vocês já ouviram falar de Meio ambiente? Antes de ler o texto vamos ver o que se entende por meio ambiente. O que vocês entendem por meio ambiente?
Um aluno – Um animal...
Outro aluno –O lugar onde a gente vive...
Outro – O lugar onde vive os seres vivos...
Outro – A natureza...
Outro – Pessoa que conserva a natureza...
Prof. – Vocês concordam com os colegas?  Olhem pela janela...O   que                     você vê lá fora?
Um aluno – árvore..
Outro aluno – arame...
Outro – Boi...
Outro – Casas...
Outro – Porco...
Prof. – Que dia foi ontem?
Aluno – Dia 1o
Prof. – E o dia da semana?
Aluno – 2a feira...
Prof. – Pois ontem foi o dia da conservação do meio  ambiente. Vamos o nosso texto. Todas as árvores que você vê lá fora são iguais?
Alunos – Nãaaao!”

O professor vai lendo o texto e a cada trecho faz perguntas aos alunos. A       partir do texto, mas ligando com o dia a dia deles.

“Prof. – O que vocês observam nestas gravuras do livro?
Alunos – Pássaros, água...
Prof. - Quais são os seres vivos aí na primeira gravura?
Alunos – Árvores, pássaros, riachos...
Prof. – Riacho é ser vivo?
Alunos – Nãaaao!
Prof. – Aqui tem tatu?
Alunos – Nãaao!
Prof. – Mas lá na roça tem. Quem já viu o mar?
Dois alunos – Eu... Eu...
Prof.– Eu nunca vi o mar, mas tem dois alunos que podem                                     falar do mar para nós. Estamos organizando uma excursão no fim do  ano para o litoral  piauiense.
Prof. – Alguém conhece rio, lagoa, açude?
Aluno – Eu vi o Parnaíba...em Teresina...
Outro aluno – Eu vi o Poty
Outro – Eu conheço o rio Berlenga...o São Nicolau...
Prof. – Então, já fizemos boa introdução sobre meio   ambiente.     O     ecossistema pode ser aquático, é representado pelos mares, rios e o terrestre, é onde nós vivemos. Agora vamos fazer uma redação sem copiar nada do livro...Vocês vão criar no assunto” (Prof. Marcos do município de Lagoa do Piauí).”

Ao contrário deste professor, alguns, inclusive com mais de vinte anos de trabalho, desenvolvem uma prática que não leva o aluno a refletir sobre os assuntos estudados, apenas informando a lição. Exemplo:

"O nosso assunto de hoje é animais vertebrados para a 4a série. Vou ditar para vocês pesquisarem as atividades. Os outros leem o livro. Podem ir lendo para responder as atividades. A 3a série, é o vento e a 2a série, as plantas. A 2a série traz o livro pra dar a lição...é a leitura do texto do  livro. A 4a série vou entregar a avaliação e a 3a série vai responder o exercício da página 75 e 76. Se quiserem responder tudo!..". A 1asérie A vai copiar a tarefa do quadro:

                     Ba  be  bi  bo  bu                      da   de   di   do   du
                     Ca  -     -   co  cu                       fa   fe    fi     fo   fu

A 1a série B vai estudar as sílabas das palavras que vou escrever no outro quadro.

            Ana, uva,   Eva, coco,   apito,   escola,   anta.


A 2a série...abram o livro de ciências na página 19. Responder o exercício sobre as plantas".

A maioria dos professores, de classes  multisseriadas desta pesquisa manda os alunos, principalmente de 3a e 4a séries, ler o assunto do livro e depois copiar o exercício do livro ou do quadro de giz e responderem e ao final da aula o professor os corrige pelo livro do professor que já vem com as respostas. As 1a e 2a séries recebem uma atenção maior com explicações e tarefas. Embora as secretarias municipais de educação estabeleçam um sistema de avaliação mensal, na prática, os professores leigos somam a nota da avaliação mensal com os pontos que ele atribui às tarefas de sala de aula ou de “dever de casa” para aumentar a nota do aluno, principalmente, quando este não alcança nota aprovativa.

Desse modo, apesar da importância dos saberes da experiência, estes se encontram desvinculados do processo de formação do docente de educação básica, principalmente porque os professores formadores nem sempre são também formados para que estes saberes que fazem a mediação entre os diversos saberes concorrentes que emergem em sala de aula. Os formadores, em geral, atentam somente para o cumprimento dos conteúdos científicos propostos nos planos curriculares. Isso decorre de uma prática dogmática que o impede de articular os diversos saberes que interferem no processo de ensino e aprendizagem.

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_______, Maurice.  Savoir et expérience chez les enseignants de métier: quelques pistes et jalons concernant la nature des savoir d’expérience. In Hélène   Hensler. La recherche en formation des maître: détour on  passade   obligé sur la voie de la professionalisation? Québec, Sherbrook Édition du CRP, 1993. pp. 53-86.
________, Maurice et GAUTHIER, Clermont. L’enseignant comme acteur racionnel: quelle rationalité , quel savoir, quel jugement. In Perrenoud et  al. des professionnels de L’enseignement. Bruxelles, Éditions de Boeck, 1995.



2 Ensino Mútuo. Introduzido na Inglaterra, em 1873, trazido de Madras (India) pelo Padre Bel e pelo pedagogo Joseph Lancaster. É o tipo de ensino onde os mais capazes, tornam-se monitores e desempenham o papel de professor junto a seus colegas com maiores dificuldades.
3Cf. Cette conception  du savoir  professionnel  s’appuie sur une vision empiriste de l’expérience qui opère à deux niveaux. Au premier niveau, qui est au fond celui de l’expérience quotidienne, celle-ci est vue comme un processus d’essais et d’erreurs, ....un processus d’apprentissage spontané qui  permet d’acquérir des certitudes quant à la façon de contrôler les faits et les situations qui se répétent”. “Le second niveau, l’expérience cesse d’être un processus spontané pour devenir un processus conscient, systématique, volontaire et méthodique    (p.63 ).